quarta-feira, abril 17, 2013

Robert Redford, "made in USA" (2/2)

De Gente Vulgar (1980) até ao novíssimo Regra de Silêncio, agora estreado entre nós, Robert Redford é uma das vozes mais consistentes (e também menos conhecidas) da mais nobre produção made in USA — este texto foi publicado no Diário de Notícias (3 Abril), com o título 'A história tem muitas razões'.

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Na espantosa teia dramática de Regra de Silêncio, Robert Redford confere especial importância à cena em que o jornalista Ben Shepard (Shia LaBeouf) vai à prisão entrevistar Sharon Solarz (Susan Sarandon), a activista do “Weather Underground” acusada de envolvimento na morte de um homem. É uma importância que decorre de um factor hoje em dia menosprezado por esse cinema barulhento, dito de efeitos especiais, em que se confunde velocidade narrativa com imagens “agitadas”. Esse factor é a duração. A saber: a sensação de que o tempo se acumula de forma perturbante, intensificando ideias e emoções.
O tempo, justamente, é a questão central colocada por Sharon a Ben. E não apenas em função do seu labor de investigação: será ele capaz de compreender a complexidade da situação (política, social, afectiva) vivida, nos anos 70, por ela e os seus companheiros? Há outro factor que Sharon, por assim dizer, transfere para Ben, perguntando-lhe que razão, no contexto da sua profissão, o poderá levar a assumir riscos. Em boa verdade, Redford relança um elemento central do cinema liberal americano (Richard Brooks, Sydney Pollack, Alan J. Pakula, etc.), de que ele é o mais directo e legítimo herdeiro: fazer história tem tanto de acesso às memórias como de discussão das condições presentes de transmissão dessas mesmas memórias.
Regra de Silêncio é mesmo um filme que resiste aos efeitos do mais pobre imaginário televisivo que tende a encenar a história colectiva como a ilustração de um “sentido” predeterminado. Dito de outro modo: quando Ben procura a razão que Sharon lhe pede, depara com uma perturbante pluralidade de razões. Reconhecer tal pluralidade é o mais nobre desafio do jornalismo que ele representa e, por certo, uma regra de ouro da excelência cinematográfica que Redford simboliza.