segunda-feira, janeiro 15, 2018

Para sentir saudades...


E, de uma assentada apenas, dois reencontros. Daqueles que fazem entender o sentido da palavra “saudade”. Porque os não víamos há já algum tempo. E, mais ainda, porque deixam saudade ao ficar evidente (sem surpresa) como eram bem melhores no que faziam do que aqueles que, entretanto, tomaram os seus lugares... Apresentador, durante 33 anos, de um talk show em formato “late night” (primeiro na NBC, de 1982 a 1993, e depois na CBS, de 1993 a 2015), David Letterman é figura maior na história da televisão americana. A ausência do pequeno ecrã nos últimos três anos termina com o regresso num modelo que pode fazer escola: uma entrevista mensal (no Netflix), com um convidado de renome, no qual a conversa pode fluir sem a pressa nem a agenda habitual num talk show diário.

A barba “bíblica” como a descreve Barack Obama é a nova imagem com a qual se apresenta. Mas a arte da conversa e a inteligência do humor são os de sempre. É bom ter de volta David Letterman. Obama foi, claro, o primeiro convidado numa temporada que, mais adiante levará àquele mesmo estúdio de televisão figuras como as de George Clooney, Malala Yousafzai, Jay-Z, Tina Fey e Howard Stern.

A escolha para o primeiro episódio não podia ter sido melhor. Foi a primeira entrevista que Obama deu depois de ter deixado a Casa Branca. E mesmo tendo-se falado da “casa” que ocupou durante oito anos, a verdade é que não foi sequer preciso falar do atual inquilino para que o óbvio se fizesse notar: as diferenças são abissais, pois são. E em todas as frentes, tanto no conteúdo das palavras trocadas como na forma do discurso. Uma plateia, com saudade, ouvia-o atentamente no estúdio. E Letterman não escondeu também essa saudade. Aqui e ali com uma farpa de humor bem lançada. Neste primeiro episódio Obama e Letterman falam de política. E até mesmo do que é a presidência. Mas o diálogo flui entre o plano pessoal e o coletivo com espaço para revelar, por um lado, o que foi o ano seguinte na vida de Obama e, ao mesmo tempo, mergulhar em histórias do seu passado (nomeadamente a relação com os seus pais), dividindo bem o tempo para ceder ainda espaço a reflexões sobre a sociedade e a política. E num segmento em que o programa sai de estúdio vemos Letterman a atravessar com o senador John Lewis a mítica ponte em Selma, no Alabama, que assistiu em 1965 a um episódio marcante na história da luta pelos direitos civis que, entre as suas consequências, teve a eleição do próprio Obama para a presidência dos EUA.

No fim do programa fica a sensação de uma boa hora de televisão. E saudades... Mas de as de David Letterman podemos novamente resolver em fevereiro com George Clooney, já as de Barack Obama são um caso, para já, mais complicado... Mas servem para que pensemos no nosso futuro.