segunda-feira, novembro 28, 2016

O sr. Zuckerberg e o sr. Trump

FOTO: Under30CEO
Afinal, algumas televisões que proclamavam o Facebook como um imaculado milagre de civilização, estão preocupadas com a possibilidade de os circuitos de Mark Zuckerberg não terem sido exactamente neutros na eleição de Donald Trump... A sério? — este crónica de televisão foi publicada no Diário de Notícias (25 Novembro), com o título 'Quem tem medo do Facebook?'

Subitamente, o Facebook tornou-se assunto de debate em muitas televisões, com resultados que envolvem um misto de perturbação e ridículo. Não quero cair em generalizações fáceis, quanto mais não seja porque a abundância de canais torna impossível qualquer avaliação definitiva. Em todo o caso, registo: dos dois lados do Atlântico, canais de diferentes conteúdos e sensibilidades parecem estar genuinamente preocupados com o facto de as notícias falsas publicadas no Facebook em torno do candidato Donald Trump (p. ex.: o apoio que teria recebido do Papa Francisco) terem contribuído decisivamente para a sua eleição para a Casa Branca.
O assunto é grave. E exige formas de reflexão muito sérias, em particular porque o Sr. Mark Zuckerberg proclamou (numa célebre carta aos investidores do Facebook, em 2012) que as redes sociais podem trazer “mais responsabilização aos executivos e melhores soluções para alguns dos maiores problemas do nosso tempo”. Como recorda um recente editorial de The New York Times (19 Novembro), “nada disso irá acontecer se ele continuar a deixar mentirosos e vigaristas tomar conta da sua plataforma.”
O que é que isto tem a ver com as televisões? Tem tudo a ver. Muitos discursos televisivos, combinando indiferença e futilidade, gostam de celebrar as redes sociais — com destaque para o Facebook — como um oráculo divertido e juvenil, dispensado de qualquer forma de responsabilidade e responsabilização. Em muitos canais, a atitude dominante face ao Facebook sempre foi de lamentável ligeireza, não poucas vezes citando os seus conteúdos como fonte inquestionável de informação. Que, agora, esses mesmos canais convoquem especialistas, estatísticas e apresentadores de olhar inquieto para nos dizerem que vem aí o lobo... eis uma farsa que dá que pensar: andavam apenas distraídos ou estão a gozar com os espectadores?