segunda-feira, janeiro 18, 2016

O Sporting segundo Marisa Matias

A. Como se diz na gíria da Net, as "redes sociais" agitaram-se (leia-se: produziram mais uma enxurrada de insultos) a pretexto de uma observação de Marisa Matias sobre o Sporting Clube de Portugal [video], feita durante uma entrevista ao Observador.

B. O episódio, de tão tristemente caricato, diz muito, não sobre o universo da política, mas sobre a percepção desse universo por muitos cidadãos. Não temos, hélas!, uma classe política exemplar, capaz de sustentar um verdadeiro espaço de confronto e pensamento. Além do mais, na carência desse espaço, o Bloco de Esquerda parece-me ser uma derivação pueril sobre o desgastado imaginário de "esquerda", apenas invulgarmente hábil na ocupação do espaço mediático, em particular televisivo. Seja como for, as abundantes formas de difamação de Marisa Matias por causa da sua observação "futebolística" são reveladoras dos valores (ou da falta deles) que dominam o território "aberto" da Net, numa lógica de contínua consagração da irresponsabilidade, temperada de frivolidade. É mesmo impressionante verificar que, por certo assumindo o seu inquestionável direito de expressão, haja tantos cidadãos que descobriram nas palavras de Marisa Matias uma razão fundamental para reavaliarem o sentido (pró ou contra) do seu voto.

C. Roland Barthes escreveu, uma vez, que por vezes é preciso defender a "excepção dos místicos". Não estaremos a discutir coisas tão inebriantes — digamos apenas, mais simplesmente, que importa defender o direito de Marisa Matias a não ser difamada apenas porque, por breves segundos, ousou testar os poderes da ironia.


> NOTA — Entretanto, Marisa Matias achou por bem vir "explicar-se", lembrando a importância do "sentido de humor" e evocando até as preferências sportinguistas do seu pai. No seu triste bom senso, a explicação aceita, implicitamente, a lógica discursiva dos que a insultaram, evitando enfrentar a degradação cultural promovida por significativos sectores "sociais" em rede  — é, a meu ver, um gesto de absoluto simplismo político.