quinta-feira, novembro 20, 2014

Mike Nichols (1931 - 2014)

J. L.: Na história de Hollywood, é um dos criadores que pode simbolizar de forma mais eloquente as relações frutuosas entre cinema e teatro, cinema e televisão — o realizador Mike Nichols faleceu no dia 19 de Novembro, contava 83 anos.
Muitas vezes citado pelas invulgares distinções que acumulou — é dos poucos criadores premiados nos Oscars (melhor realização por A Primeira Noite, de 1967), Emmys, Grammys e prémios Tony —, Nichols foi, antes de tudo o mais, um hiper-dotado director de actores. Numa entrevista dada no ano 2000 à revista The New Yorker, Dustin Hoffman disse mesmo que a sua escolha para protagonizar A Primeira Noite terá sido, da parte de Nichols, uma das "mais corajosas" opções de casting tomadas ao longo do séc. XX — na altura quase com 30 anos, Hoffman interpretava um jovem de 21 anos que mantinha relações com a mulher (Anne Bancroft) do melhor amigo do seu pai, vindo depois a apaixonar-se pela sua filha (Katharine Ross). O filme valeu a Nichols um Oscar de realização.
São muitos os exemplos de notáveis interpretações nos filmes de Nichols, a começar pelo quarteto — Elizabeth Taylor, Richard Burton, Sandy Dennis e George Segal — do seu primeiro trabalho como realizador, Quem Tem Medo de Virginia Woolf? (1966), segundo a peça de Edward Albee; mesmo sem chegar ao título de melhor do ano, o filme acabaria por arrebatar cinco estatuetas douradas, sendo uma para Taylor (melhor actriz) e outra para Dennis (actriz secundária). Inesquecíveis são também, por exemplo, as composições de Jack Nicholson e Ann-Margret em Iniciação Carnal (1971), Meryl Streep e Cher em Reacção em Cadeia (1983), Shirley MacLaine e de novo Meryl Streep em Recordações de Hollywood (1991), ou Harrison Ford e Annette Bening em O Regresso de Henry (1991).
O nome de Nichols é também indissociável de um momento marcante na história moderna da televisão: a série Anjos na América (2003), produzida pela HBO, adaptava com raro fulgor e sentido crítico a peça de Tony Kushner sobre a descoberta da sida e as convulsões morais da década de 80, de novo envolvendo um elenco em estado de graça, incluindo, entre outros, Al Pacino, Meryl Streep e Emma Thompson. Sendo um objecto televisivo de excelência, a sua concepção eminentemente cinematográfica levava mesmo Nichols a assinar no genérico como a film by [video].


Nos últimos anos, Nichols dirigiu dois filmes magníficos: Perto Demais (2004), adaptação da peça de Patrick Marber, com o quarteto Julia Roberts, Jude Law, Natalie Portman e Clive Owen; e Jogos de Poder (2007), sobre o envolvimento de um congressista texano nos bastidores do Afeganistão, com argumento de Aaron Sorkin e, nos papéis principais, Tom Hanks, Julia Roberts e Philip Seymour Hoffman. Além do mais, Nichols foi sempre um homem do teatro, já premiado com um Tony (Descalços no Parque, 1964) antes mesmo de começar a trabalhar no cinema — em 2012, dirigira uma nova encenação de Morte de um Caixeiro Viajante, de Arthur Miller, com Philip Seymour Hoffman, Andrew Garfield e Linda Emond, trabalho que lhe valeu o nono Tony da sua carreira.

>>> Obituário de Mike Nichols: BBC + New York Times + Variety.