terça-feira, outubro 21, 2014

Em conversa: Perfume Genius (1)


Voltei a conversar com Mike Hadreas a propósito de um disco do seu projeto Perfume Genius, desta vez com Too Bright na berlinda. Esta entrevista serviu de base a um artigo publicado no DN.

Fez dois discos lentos, com canções de enorme fragilidade. E agora surge um álbum que se apresentou ao som de duas canções completamente diferentes. Era preciso mudar? 
Tentei ir um pouco mais longe com este disco, em todos os sentidos. E não seria justo para com o disco se não o começasse a apresentar com canções que que deixam claramente essa ideia de mudança. Até a capa do disco queria que traduzissem uma sentido de força muito especial. Não que as outras canções não fossem fortes, mas traduzem um outro sentido de força.

Há uns anos apresentava como foto oficial o seu rosto com um olho esmurrado. Agora o homem que se mostra na capa do novo disco parece ser aquele que dá murros...É um pouco essa a ideia. Sim...

Conquistou uma certa auto-confiança? O que mudou?
Conquistei alguma confiança, sim. Durante algum tempo mantive uma certa atitude de quem tomava um olhar de vítima perante o mundo. Estava em modo de defesa. Ressentia o mundo. Mas não estava mais a funcionar para mim manter-me nesse modo, paciente e apologético. Isso ainda está um pouco comigo, é verdade. Mas esta canção foi uma maneira de procurar ir para além disso, me dá força. Uma força que não vem da mudança, mas de um orgulho em ser quem sou e como sou. Não a fazer as coisas de forma diferente, mas processando-as de outra maneira. Ao mesmo tempo é uma canção em que aponto o dedo a outras pessoas também.

Fazer canções, enfrentando plateias, foram lições de autoconfiança para si nestes últimos anos?
Estar ali à frente de toda a gente? Sim... Mas mesmo que as coisas tenham melhorado, e estou mesmo satisfeito com isso, ainda não me encaixei a 100%... Mesmo que a música traduza a autoconfiança maior que sinto, é mais uma projeção do que quero ser. É um lugar a que sei que posso chegar se me livrar dos meus problemas e das minhas inseguranças ridículas. Aos poucos estou a chegar lá... Mas sou uma pessoa de humores... Mas se me sento e paro para pensar lembro-me de como, há quatro anos, ficava aterrorizado só por estar em palco. Agora estou preocupado com o concerto, mas não com o facto de ter de lá estar. É importante para mim fazer as coisas mesmo que me assustem. Há anos sentia demasiadas inseguranças. Este disco envolveu algum rico para mim. Envolveu enfrentar a timidez de partilhar estas coisas. Mas é importante mostrar as coisas. E é por isso que o lado performativo é também importante.

Há mais raiva neste disco? 
Sim... Os meus dois primeiros discos tinham a ver com o enfrentar do meu passado. Eram coisas que já tinham acontecido e era importante ter compaixão e ser gentil para com essas coisas. Não que esses dois álbuns não tenham qualidades de coragem e força, mas havia uma doçura na forma de lidar com tudo. Mesmo quando os temas eram negros... Desta vez era importante para mim agir de forma diferente. Era mais terapêutico para mim estar zangado... Pode parecer mais sofisticado, mas é mais gutural.

(continua)