segunda-feira, julho 28, 2014

Quem inspira Wes Anderson? (parte 1)


Numa altura em que esperamos pelo lançamento em DVD de Grand Bupapest Hotel entre nós, fica um olhar sobre o cinema de Wes Anderson, tendo por base o livro que olha para os primeiros 20 anos da sua carreira. Este texto é parte de um artigo originalmente publicado no suplemento Q. do DN com o título ‘Partir dos filmes para achar o seu cinema’.

Matt Zoller Seitz conheceu Wes Anderson há 20 anos. Foi em Dallas. Ele era então um jovem crítico de cinema a dar os primeiros passos e Wes tinha visto a sua primeira curta-metragem, Bottle Rocket (1994), ser aceite pelos programadores de um festival de cinema naquela mesma cidade texana. Matt escreveu na ocasião uma pequena crítica “positiva”, achando o seu estilo “suficientemente interessante” para, nos tempos que se seguiram, ter voltado a assinar novos trabalhos jornalísticos sobre Wes Anderson e o seu principal colaborador de então, Owen Wilson, quando tentavam desenvolver uma possível longa-metragem a partir dessa mesma curta inicial. Esse era um filme de 12 minutos, filmado a preto e branco em película de 16 mm e todo ele produzido em Dallas depois de Wes e Owen terem terminado os estudos na University of Texas, em Austin.

Matt e Wes voltaram a encontrar-se várias vezes. E num visionamento para a imprensa de Os Tennenbaums – Uma Comédia Genial (título original The Royal Tennembaums, de 2001) no New York Film Festival, Matt reparou inclusivamente que num dos planos exteriores, rodados em Brooklyn, a casa onde vivia com a sua família passou pelo olhar da câmara e, agora, ali estava para todos a verem no grande ecrã. Depois de Gostam Todos da Mesma (título original de Rushmore, filme de 1998) a relação do jornalista com o realizador tornara-se mais próxima mas, para a concretização deste volume que cruza imagens, ensaios sobre os filmes (até Moonrise Kingdom, o que deixa de fora o Hotel Budapeste (no original Grand Budapest Hotel, já estreado este ano) e uma entrevista por cada um dos títulos evocados, passaram 20 anos. Duas décadas de textos, filmes e contactos, o que não significa que o que aqui encontramos seja material de arquivo. Na verdade, Wes e Matt chegaram mesmo a fazer novas e mais extensas conversas que agora lemos como uma narrativa em continuidade. O conjunto, devidamente arrumado, e que o autor descreve como “uma digressão pela mente de um artista, tendo-o a ele mesmo como guia e companheiro” (1), dá-nos assim uma oportunidade de conhecer a fundo as referências, intenções, histórias de rodagens e marcas de personalidade de um realizador no pico da sua forma e ainda com muito para nos dar. Hotel Budapeste é por isso mesmo um primeiro exemplo de como, num futuro, haverá ainda histórias a acrescentar ao que aqui se conta e vê.

Com uma estrutura cronologicamente ordenada, tendo cada uma das longas-metragens de Wes Anderson como unidades temáticas (que assim arrumam também o evoluir dos tempos), o livro começa por evocar algumas das referencias que estruturaram o gosto e o interesse pelo cinema em Wes Anderson. O primeiro filme que viu, ainda em criança, foi um dos títulos da série ‘A Pantera Cor-de-Rosa’, e entre as memórias mais remotas junta ainda animações da Disney e The Apple Dumpling Game, western de 1975 de Norman Tokar com Don Knotts, do qual Wes “acha que gostava” (2) .

O passo seguinte, teria ele uns 11 ou 12 anos, corresponde à descoberta de Hitchcock em vídeo (tinha um sistema Betamax em casa), filmes dos quais diz que “a estrela estava por detrás da câmara” e que o impressionaram. A Janela Indiscreta tornou-se um dos seus preferidos, sobretudo pelo facto de nunca se sair do apartamento (e de tudo o que vemos partir do ponto de vista de quem ali está), mas também pela escrita e o elenco. Pouco depois foi com A Guerra das Estrelas (George Lucas, 1977) que deu por si a estudar um filme com mais atenção. E foi por essa altura que o interesse por ver cinema se cruzou também com o verbo “fazer”.

(1) in The Wes Anderson Collection, de Matt Zoller Seitz (Abrams, 2013), pag. 26
(2) ibidem, pág. 37