quarta-feira, julho 09, 2014

O cinema, as ideias e a música
segundo Derek Jarman (1)

Este texto é um excerto de um artigo sobre Derek Jarman originalmente publicado na edição de 27 de junho do suplemento Q, com o título ‘Por detrás da câmara de Derek Jarman’. Um livro com os cadernos de apontamentos do realizador e um filme rodado em 1984 só agora revelado permitem novos pontos de vista sobre o seu trabalho, reforçando a história de um relacionamento importante com a música.

No dia em que a atriz Tilda Swinton conheceu o realizador Derek Jarman, este abriu-lhe a porta do apartamento onde então vivia de câmara de vídeo na mão. Beberam um chá. E depois o realizador mostrou-lhe um bloco de apontamentos do tamanho de um álbum de família. Estava ali o filme, dizia ele, apresentando as ideias que durante os últimos 11 anos tinha reunido para a longa-metragem que um ano depois nasceria sob o título Caravaggio (1986).

Esses e outros apontamentos surgem agora reunidos em Derek Jarman’s Sketchbooks, num livro que nos permite não apenas um mergulho no seu processo criativo como acrescenta mesmo ao cinema de Jarman modos de arrumar e expor as ideias e as imagens que o inspiravam. “Cada um dos cadernos de apontamentos representa o que de mais próximo imagino do que poderia estar a ser trabalhado na sua cabeça”, descreve Tilda Swinton no prefácio em que chama a estes cadernos de anotações “as pilhas do seu processo criativo”.

Os cadernos são, de facto, uma parte importante da obra de Jarman e juntam não apenas factos, reflexões e outros escritos, mas também elementos visuais que podemos ligar inclusivamente a etapas mais remotas da sua formação artística. Num dos textos que agora ali surgem entre as páginas de Jarman, o jornalista Jon Savage sublinha que o realizador “começou como pintor e os belos desenhos e anotações na sua mão instantaneamente reconhecível mostram o processo em que as cores, as cenas, e os argumentos eram trabalhados”.

Ao estudar na Salde School, Jarman passou muito do seu tempo no departamento de teatro, onde desenhou cenários, sobretudo para bailados e óperas. Mas depois de colaborar na cenografia de Os Diabos, de Ken Russell (1971), começou a trabalhar com filmes Super 8. E é nesta altura que emerge um pensamento cinematográfico em si e com ele nasce o hábito de criar blocos de apontamentos.

Em 1976 (cinco anos depois de apresentar a sua primeira curta) apresentava o ímpar Sebastiane, a sua primeira longa-metragem. No mesmo ano filmou uma banda num ensaio num sótão. “Chamavam-se Sex Pistols e essas imagens acabaram, não creditadas, no filme The Great Rock and Roll Swindle, em 1980”, relata Jon Savage, que lembra ainda outro episódio fulcral no estabelecimento de uma relação entre o realizador e a nova geração de músicos que então emergia em Sloane Square: A Room of One's Own (curta apresentada também em 76). Forçado a abandonar o seu apartamento, “resolve destruí-lo numa última festa”. E então filmou o caos ali gerado.

(continua)