terça-feira, outubro 22, 2013

Elogio do "lyric video" (10/10)


E se o primeiro teledisco tivesse sido também o primeiro lyric video?... Enfim, não confundamos tudo, quanto mais não seja porque se fala aqui de um tempo cerca de um quarto de século antes da eclosão da MTV. Mas é um facto que, por vezes, as lendárias imagens, a preto e branco, de Bob Dylan a "interpretar" Subterranean Homesick Blues são citadas como o mais remoto antepassado dos telediscos — a canção foi lançada, em single, a 8 de Março de 1965, dezanove dias antes do respectivo álbum, Bringing It All Back Home, o quinto de estúdio na discografia de Dylan. E não é verdade que a lógica informativa do lyric video surge, aqui, posta em prática de forma saborosamente irónica, com versos abreviados e alguns "erros" deliberados?
Manda a objectividade histórica que se diga que o trabalho do realizador Richard Lester na primeira aventura cinematográfica dos Beatles, A Hard Day's Night, não pode ser esquecido na antologia dos antepassados dos telediscos — e esse filme foi lançado no Reino Unido a 6 de Julho de 1964. Além do mais, as imagens de Subterranean Homesick Blues fazem parte de um filme emblemático estreado em 1967, o lendário Dont Look Back, de D. A. Pennebaker, no essencial rodado em 1965 durante a célebre digressão inglesa de Dylan marcada pelos protestos de muitos espectadores, revoltados contra a integração de guitarras eléctricas na sua música (foi o lado A do LP de Bringing It All Back Home que serviu, justamente, de primeira expressão dessa viragem, sendo Subterranean Homesick Blues a faixa nº 1).
De acordo com o próprio Pennebaker, o registo terá ocorrido no final da rodagem, acabando por ser escolhido para funcionar como abertura do filme. Uma coisa é certa: mostrado regularmente como segmento autónomo, o fragmento de filme acabou por adquirir o estatuto televisivo de teledisco, passando a ser indissociável da memória iconográfica da canção. Para a história, fica o cenário da performance: as traseiras do Savoy Hotel, em Londres. E também, à esquerda da imagem, a figuração garantida por duas personalidades muito ligadas ao universo artístico e pessoal de Dylan: o poeta Allen Ginsberg e o produtor Bob Neuwirth.