quarta-feira, setembro 11, 2013

Em conversa: The Knife (1)

Iniciamos a publicação da versão integral de uma entrevista com Karin e Olof Deeijer dos The Knife, que serviu de base a um artigo publicado no DN.  

Igualdade de género, distribuição equitativa da riqueza, um ambiente mais limpo, idênticas oportunidades para todos os cidadãos do mundo... O mundo está preparado para fazer das ideias que apresentam em 'Shaking The Habitual' uma realidade? 
Olof – Será que alguma vez vamos alcançar a igualdade de género? Temos de dizer que sim... Mas não sei como responder. Mas as pessoas tendem a esquecer que a luta por uma sociedade sem classes, não racista, com igualdade de género e não homofóbica não é uma coisa linear que evolua sempre num só sentido. Na verdade há avanços e recuos. Em algumas situações já se esteve melhor. Mas é importante continuar a lutar. Porque podemos obter direitos que perdemos num ano seguinte se, por exemplo, tivermos um governo de direita. Na Suécia desmantelámos o sistema de saúde nos últimos dez anos...

Um disco pode-nos fazer parar para pensar sobre estas questões concretas? 
O - É muito bom se fizer isso.  

Sentem falta de uma voz política em muita da música pop dos nossos dias? 
Karin – Há um grande problema na música de hoje. Está mais comercializada. Está mais ligara a interesses comercias. Muitos artistas têm patrocinadores, muitos colaboram com empresas. E isso mata a curiosidade na música. Faz com que os artistas deixem de achar que têm de ter responsabilidades. Falo da responsabilidade em usar liberdade de se poder falar sobre certos assuntos. A música está mais comercializada. E isso tem muito a ver com o facto das pessoas terem deixado de pagar pela música. Pagam antes às companhias de telecomunicações. As pessoas pagam os telefones e as companhias de comunicações, de certa maneira, criam a música. Gerem os festivais, editam a música, disponibilizam a música. Parece que a música tem de estar alinhada com os interesses das empresas de comunicação. E essa situação é muito estranha. As pessoas ficam até a pensar eu bom que é ter a música á borla, de não ter de pagar por ela. Mas não terão nova música.
O – Pagamos com o tempo que passamos a ver anúncios  

E podem os músicos viver fora desse circuito? A independência é possível? Independência artística e económica, entenda-se...
O – falamos a partir de uma situação muito privilegiada, porque podemos viver do que fazemos como músicos. Somos bastante conhecidos, por isso as salas e recintos onde tocamos são muito grandes e podemos receber dinheiro suficiente e assim ter uma existência autónoma. Mas por estarmos ativos num ambiente mainstream temos de lidar com a presença do capital, se patrocinadores... É uma luta diária tentar limitar a presença de patrocinadores nos palcos nos festivais, para que o público possa ver o espectáculo sem a presença de interesses comerciais. É difícil ser completamente autónomo.  

Muita desta industria é dominada pela presença do homem. Mas tentam também aí intervir... 
O – Este mundo mainstream e comercial é muito heterormativo e dominado pelos homens. Os festivais são diferentes entre si, mas não são um lugar seguro para toda a gente. Falo de pessoas queer. Dependendo do mood do dia sinto que é bom estarmos ali a fazer um espectáculo queer. Noutros dias pergunto a mim mesmo o que estamos ali a fazer, perante pessoas a rir. E não vamos mudar as opiniões daqueles tipos. Sei, pela nossa equipa técnica, que costumamos ter boas reacções por parte das equipas locais, que gostam de trabalhar connosco. Talvez haja aí uma mudança a começar a acontecer.  

A BD que juntam ao álbum fez com que os artigos publicados sobre o disco discutissem não apenas a música mas também os assuntos abordados. Fazem com que os media falem dos assuntos e as pessoas leiam...
K – Esperamos que sim...
O – É como temos trabalhado nos últimos anos. Convidamos pessoas de outros campos, mesmo fora da música, que também se interesses pelas temáticas queer, feministas e pelo socialismo. Liv Stromquist é a autora que criou aquelas discussões sobre finanças, economia, na BD.  

Como se interessaram por estes assuntos? 
K – Creio que foi aos poucos. Crescemos com um pai que tinha uma visão socialista e comunista das coisas. Daí começámos a pensar em questões de igualdade entre o homem e a mulher. Interessei-me depois pelo feminismo. Para mim começar este projeto foi uma maneira de combinar, de ler mais teorias sobre estes assuntos e combina-las com a música. Foi a melhor combinação que me ocorreu. O Olof teve a estudar gender studies na universidade. Pegámos na sua bibliografia e comecei também a ler. Foi muito bom encontrar teorias por detrás destas ideias. Foi bom poder estruturar essas ideias.