quarta-feira, dezembro 28, 2011

Em conversa: Osso Vaidoso (1/2)

Autores de um dos melhores discos portugueses dos últimos anos, os Osso Vaidoso são Ana Deus e Alexandre Soares, músicos experientes e com vidas anteriores em variados projectos. Esta é a primeira parte de uma entrevista que serviu de base a um texto publicado no DN a 23 de Dezembro.


Já tinham trabalhado juntos numa etapa de vida dos Três Tristes Tigres. O que vos levou a juntar esforços num projecto comum?
Alexandre Soares - Começou com um reencontro num convite dos Dead Combo num concerto no Plano B, no Porto. Recomeçámos a trabalhar juntos e depois o Luis Varatojo, dos Naifa, propôs-me um espetáculo no cinema S.Jorge em Lisboa “Sexta-feira meia-noite uma guitarra” com uma cantora. Pensámos que era o momento ideal para voltarmos ao palco juntos. O nome Osso Vaidoso apareceu também aí.
Ana Deus - Depois dos tigres experimentei trabalhar com músicos variados, nada de muito duradouro mas que me fez não perder "a mão" e consolidou o prazer de trabalhar mais as "palavras". E ia fazendo orelhas moucas a quem me sugeria que continuasse os Três Tristes Tigres (TTT). Apesar de não ter criado empatia suficientemente forte com nenhum músico, sabia que não queria voltar. O reencontro (ideia dos Dead Combo e não minha) foi de alguma forma surpreendente, pois já não era a mesma coisa e era ao mesmo tempo familiar e fácil, mais do que alguma vez fora.

Que memória mais remota têm do trabalho um do outro? Que atenção foram dando à evolução das duas carreiras, quando as viviam em separado? 
AS - Ia sabendo o que a Ana fazia pelos amigos comuns que me mostravam e comentavam, e também na net. Cruzávamo-nos na boa, mas não em trabalho.
AD - Eu era fã, desde os GNR. Fui a muitos concertos e sempre acompanhei o que ele fazia, Projecto Global, aquele disco dos Zero que saiu numa altura em que eu já andava atrás dele para trabalhar comigo, mas aí o Loureiro levou a melhor... Depois dos Tigres lembro-me de ver um bailado, não me recordo bem de qual, Voooum ou No fly zone, com música dele, que me deixou triste de tão bonito que era...mas fui acompanhando, quase sempre. Gosto do que o Alexandre faz, sem voz.

A capa do álbum 'Animal'
Onde encontraram a ideia para dar a voz ao som minimalista do Osso Vaidoso? 
AS - Veio desse reencontro que também começou com mais músicos, mas nós os dois estávamos totalmente disponíveis e naturalmente a ideia de um duo tornou-se mais forte. Os textos começaram a aparecer e as ideias que a Ana tinha para estes obrigou-me a estar mais pronto para o menos.
AD - Como a experiência com os Dead Combo + Alexandre tinha sido tão boa ainda tentámos fazer outro espetáculo no Serralves em festa, também com o João Pedro Coimbra, sob o nome de Nadadores de inverno, e foi muito bom, mas quilómetros e agendas apertadas deixaram cair essa ideia e o espetáculo no S. Jorge, só a dois, levantou outra. Entretanto também começámos a participar na Leitura furiosa, que tem um funcionamento muito simples e que nos deu mais canções no osso

Acham que, como em tempos reconhecíamos nuns Young Marble Giants, menos pode ser mais? 
AS - Pode. Mas não é fácil ir pelo aí, ficas com os ossos todos à mostra. Noto que quando compomos, o que não encontra rapidamente caminho, é abandonado porque não há roupagem que lhe valha.

A palavra teve peso maior na construção destas canções? 
AS - Sim, e isso obrigou-me a experimentar doutras formas, como saber estar completamente livre reconhecendo que me movo dentro de um texto.
AD - Já tinha lido-entoado-cantado alguns dos textos anteriormente, como o Elogio da pobreza e a Cola-cola song, em espectáculos de spoken word e poesia, mas o Alexandre acrescentou-lhes uma grandeza que é o que se sente para lá do dito.

(continua)