terça-feira, agosto 23, 2011

As primeiras imagens de "Tintin" (1/5)

As primeiras imagens de As Aventuras de Tintin: O Segredo do Licorne foram apresentadas à imprensa internacional num encontro num hotel de Paris — estes textos foram publicados no Diário de Notícias (20 de Agosto).

Foi em 1993 que Steven Spielberg surpreendeu o mundo com Parque Jurássico: os seus dinossauros, fabricados digitalmente, ajudaram a lançar uma verdadeira revolução, não apenas nos efeitos especiais, mas também nos conceitos criativos e comerciais do espectáculo cinematográfico. Na altura, Jamie Bell tinha oito anos. A descoberta desse filme é uma fortíssima memória da infância: “Como é que ele tinha conseguido aqueles animais incríveis?”
Steven Spielberg
Bell conquistaria o seu próprio lugar no cinema, com o sucesso de Billy Elliott (2000), filme de Stephen Daldry sobre um rapaz que não quer abdicar do sonho de aprender a dançar. Agora, é o protagonista de As Aventuras de Tintin: O Segredo do Licorne, onde interpreta o herói criado por Hergé através do processo de performance capture (a personagem é representada pelo actor e, depois, tratada digitalmente um pouco à maneira de uma figura de animação). E quem realiza o filme é... Steven Spielberg!
Primeiro título de uma trilogia produzida por Spielberg e Peter Jackson (estreia portuguesa: 29 de Outubro), as novas aventuras cinematográficas de Tintin foram apresentadas à imprensa, através de alguns extractos, num hotel de Paris. Bell e Andy Serkis (intérprete do Capitão Haddock) estiveram presentes e, naturalmente, falaram dessa “digitalização” dos actores.
Jamie Bell
Para Bell, a questão central tem a ver com a imaginação do actor: “Será que ainda tenho imaginação, será que ainda consigo estabelecer contacto com as minhas memórias de juventude? Na prática, acaba por ser um processo muito libertador: a nossa imaginação pode levar-nos onde quisermos.”
No caso de Serkis, o processo estava longe de ser uma surpresa, uma vez que, sob a direcção de Peter Jackson, já tinha assumido as personagens digitais de “Gollum”, na trilogia O Senhor dos Anéis (2001-2003), e do macaco gigante de King Kong (2005); recentemente, estreou entre nós Planeta dos Macacos: A Origem, onde ele interpreta “César”, o líder da revolta dos macacos. Em todo o caso, Serkis insiste que se trata “apenas” de um instrumento: “Para um actor, continua a haver uma representação total, imersa na personagem. Não há diferenças, a não ser que não estamos a usar guarda-roupa ou maquilhagem: alguém vai fazer isso a posteriori.” Daí a sugestiva proposta de classificação: “A melhor maneira de resumir o processo é chamar-lhe maquilhagem digital.”
Ainda assim, a experiência foi diferente dos filmes anteriores. Em O Senhor dos Anéis contracenava com os outros actores num estúdio normal e, depois, completava o seu trabalho “num outro estúdio”: agora, em As Aventuras de Tintin, “tudo foi criado no mesmo espaço digital” [Weta Digital, propriedade de Peter Jackson].
Spielberg quis que o seu filme retomasse o espírito tradicional das aventuras mais ou menos misteriosas. “É verdade que falámos dos ambientes clássicos do filme “noir”, de Hitchcock e de referências como Lawrence da Arábia”, recorda Bell. “Mas não se tratava de copiar o que quer que fosse. Para Spielberg, o essencial era apostar em qualquer coisa de novo, nunca vista. Ele consegue isso com os actores porque nos ensina a confiar no instinto, a não ter medo de arriscar, falhar e voltar a experimentar.” E a referência fulcral foi sempre “a estética dos desenhos de Hergé.”
Andy Serkis
Recordando como a experiência no teatro de repertório (Shakespeare, Brecht, Sondheim, etc.) foi essencial na sua formação, Serkis sublinha também a riqueza das personagens. E comenta assim o seu marinheiro bêbedo: “O Capitão Haddock é uma personagem fascinante, uma espécie de desastre ambulante que perdeu a identidade, transporta os pecados dos seus antepassados sem realmente compreender a sua relação com eles.”
Ao mesmo tempo que insiste no valor específico da representação, Bell acrescenta também que não vale a pena esperar grandes distinções: “Ninguém na indústria vai reconhecer este tipo de representação a ponto de ganhar um Oscar.” Mas não é isso que o preocupa. Tendo em conta a complexidade do trabalho efectuado, só não gostaria de ouvir alguém dizer-lhe: “Ah, então foi você que fez a voz de Tintin!”