segunda-feira, agosto 27, 2007

Discos da semana, 27 de Agosto

Durante o dia trabalha como executivo num escritório de uma multinacional discográfica, na Cidade do México. À noite, contudo, Camilo Lara transfigura-se e veste a pele de um músico de quarto. Sentado frente ao computador, em casa, recolhe e junta pistas de sons, como que numa amálgama organizada do muito que eventualmente escutou ao longo de mais um dia de trabalho. É assim que surge a música que escutamos sob o nome Mexican Institute Of Sound, projecto de um homem só que tinha dado primeiros sinais de vida com um álbum de estreia no ano passado e que agora vê o segundo disco, Piñata, a merecer palavras de entusiasmo pelo mundo fora. Pinãta é uma colagem sedutora de sons e caminhos que podemos imaginar em volta de uma grande metrópole como o é a capital mexicana. Colhe heranças de várias tradições latinas, mas não foge ao cenário urbano e intenso no qual nasce e, de certa maneira, pode funcionar como banda sonora. Aqui se cruzam elementos de latin funk, cumbias, o cha cha cha, o danzón, baile funk, hip hop, electro, assim como versáteis exemplos de batidas construídas por corte e colagem de samples. Apesar de pensada por um homem, a música de Pinãta conheceu a colaboração de nomes sonantes da música latina como os Café Tacuba (Máxico) e Babasonicos (Argentina). Juntos propõem uma visita no presente a uma cidade onde velhas culturas se cruzam com novos modos de vida. Numa lógica não muito distante da que escutámos em Since I Left You dos Avalanches, um estimulante retrato vivo (e vivido) do México presente.
Mexican Institute Of Sound
“Pinãta”
Cooking Vinyl / Edel
4/5
Para ouvir: MySpace


A Suécia está definitivamente a afirmar-se como o segundo exportador europeu de música popular (logo depois do Reino Unido). E sobretudo com figuras claramente instaladas em caminhos vários das músicas alternativas. Este mês chegou-nos finalmente aos escaparates o disco de estreia de uma voz que, na sua terra Natal, já dá que falar desde finais de 2004. Chama-se Frida Hyvönen e dá-se a conhecer num ciclo de dez canções criadas ao piano. O diálogo entre palavras e teclas é central no jogo que Frida propõe. Palavras que falam ostensivamente no feminino sobre romances de uma noite só, encontros homoeróticos, memórias de partes do corpo masculino que poucas vezes escutamos de forma tão directa na voz de uma mulher. Um requinte minimalista perpassa a escrita desta cantautora que agradece a inspiração de Patti Smith e dedica uma das suas canções a Djuna Barnes. A sua música ecoa o que recentemente encontrámos em Regina Spektor, todavia sem a versatilidade formal e interpretativa que fez brilhar Begin To Hope. Ocasionalmente, como se escuta por exemplo em The Modern, a genética eloquente de uma Joni Mitchell mostra-se igualmente visível. Cantando, sussurrando, em regime de franca familiaridade com o piano e acolhendo discretos arranjos entre as suas canções, Frida Hyvönen faz do álbum de estreia um cartão de apresentação interessante, que só não arrebata ainda pela relativa falta de maleabilidade (leia-se pouca versatilidade formal) que os dez temas revelam entre si. Mesmo assim, demos as boas vindas a uma sueca que os americanos descobriram em 2006 e nós, em terceiras núpcias, finalmente podemos ter nos nossos escaparates em 2007.
Frida Hyvönen
“Until Death Comes”

Secretly Canadian / Flur
3/5
Para ouvir: MySpace


A evolução música popular faz-se de uma espécie de jogo entre a visão invenção da novidade e a reinvenção ou reapropriação de pistas que, no passado, também já foram ousadia. Numa etapa de poucas visões e muitas reinvenções, como aquela em que vivemos, os pós-isto e pós-aquilos surgem a cada temporada. Uns “poses” revelam-se como famílias, uns batedores a experimentar ideias, o pelotão do papel químico, logo depois, a aproveitar as bênçãos das colheitas... Mas há memórias que se mostram reinventadas, mesmo sem uma pandilha de rostos a fazer “movimentos”. É, por exemplo, o caso do som que conheceu geniais pioneiros em bandas como os My Bloody Valentine ou Ride e que, mesmo sem um programa de acção concertado, continua a dar de beber a novas bandas. Assim, dois anos depois de deliciosas surpresas com os Midnight Movies, mais uma banda surge em cena a mostrar vitalidade na genética shoegazer. Chamam-se Asobi Seksu, vêm de Nova Iorque e dividem as suas cenções entre o inglês e o japonês, cortesia da vocalista Yuki Chikudate, cujo nome revela que vem da terra do sashimi... Circus é o seu segundo álbum e, diz quem conheceu o primeiro (não é o caso), um disco mais arrumado, ousado, de olhos ainda agarrados sos sapatos mas ambições de cabeça erguida. O disco mostra claras heranças de um som que sabe conciliar uma muralha de electricidade com a sedução da melodia. Por aqui ecoam memórias estruturais de uns My Bloody Valentine, claro, mas também o sentido de liberdade de uns Moose, a tradição melodista ao jeito de uns Ride e o poder pop de uns Darling Buds. O álbum é um concentrado de intensidade, com exemplos de boas canções e sugestões claras de uma obra em busca de uma linguagem, sob vontade de cumprir nos factos as promessas que lhes têm sido prometidas na imprensa...
Asobi Seksu
“Circus”

One Little Indian / Compact
3/5
Para ouvir: MySpace


A história da música popular está cheia de exemplos que nos mostram que, muitas vezes, a soma das partes não iguala nunca o todo. Ou seja, frequentes são os casos de carreiras a solo que nunca se aproximam da obra que os mesmos músicos registaram nas bandas a que pertenciam (ou ainda pertencem). E o caso de Frank Black não deixa quaisquer dúvidas. Em inícios de 90, depois do relativamente menor (mas ainda interessante) Trompe Le Monde, os Pixies seguiram caminhos separados. E durante dois álbuns (os mais cativantes da sua vida de 15 anos a solo), Frank Black pouco mais foi que o herdeiro directo e natural de Black Francis... E muita da dinâmica na escrita e pujança performativa dos Pixies ainda morou naqueles dois álbuns. Com o tempo, Frank Black desviou as suas atenções para um rock menos urgente e mais clássico. E nos últimos anos, sedeado em Memphis, começou entretanto a desenvolver uma demanda cuidada como cantautor (que ainda não gerou um álbum ao nível do que já fez por outros caminhos). Nos últimos anos, na verdade, temo-lo visto (e escutado) mais em concertos de revisitação da memória dos Pixies. Talvez esse arrumar de ideias tenha motivado igual vontade de revisão de matéria dada a solo. E assim podemos imaginar uma justificação para uma antologia que, na verdade, não tem muito para contar, além de uma sucessão cronológica de eventos que, salvo em pontuais momentos, não teriam motivado grande interesse não fosse o facto do seu autor ser o vocalista dos Pixies. Aqui estão reunidos dez anos de memórias, as mais interessantes captadas em Frank Black e Teenager Of The Year. Como bónus, para coleccionadores e admiradores, um CD extra com registos ao vivo.
Frank Black
“93-03”

Cooking Vinyl / Edel
2/5
Para ouvir: MySpace


O único projecto “sobrevivente” da primeira geração de bandas do catálogo da mítica Factory Records continua activo e soma já mais de vinte álbuns de originais, numa carreira de versatilidade evidente, que passou já por diversos caminhos e comprimentos de onda. Em 2007, os Durutti Column apresentam Idiot Savants, um ciclo de oito longos temas através do qual se estabelecem pontes entre a genética para voz e guitarra que Vini Riley tornou medula da sua existência desde a sua estreia em 1980 e uma série de novos estímulos, nomeadamente uma vontade em explorar um sentido mais longo e lento de progressão na construção das canções, assim como um desejo em fazer do presente uma marca clara na vida de mais um disco dos Durutti Column. É certo que há já muito que não vemos em Vini Riley um autor determinante para a invenção do presente (e mais além) como o foi nos dias em que editou álbuns como The Return Of The Durutti Column, LC ou Circuses and Bread (isto sem esquecer o espantoso Amigos Em Portugal, que finalmente teve reedição em CD há dois anos. Longe vai também já Fidelity (2001), o mais recente dos seus álbuns com impacte acima do culto de seguidores que o acompanha há quase 30 anos. Mas a verdade é que nos últimos anos, mesmo sem a exposição de outrora, Vini Riley tem mantido uma actividade regular, tanto na edição como na capacidade de manter viva e minimamente reinventada uma linguagem musical cuja patente é sua. Idiot Savants é talvez o seu melhor disco desde Fidelity, mostrando como é possível citar memórias pós-punk sem cair nos lugares comuns que fazem a ordem do dia nesse rentável filão do momento. Melancolia com alma própria, guitarras vivas e uma voz sempre desencantada, num disco que não envergonha uma carreira que já foi mais determinante. Mas que ainda não terminou e parece ter que contar...
Durutti Column
“Idiot Savants”

Artful
3/5
Para saber mais: Site oficial


Também esta semana:
Pink Floyd (Piper At The Gates of Dawn – caixa), Super Furry Animals, Luke Vibert, VHS or Beta, Procol Harum (best of), Ringo Starr (best of)

Brevemente:
3 de Setembro: Hard Fi, Blue States, Luke Vibert, They Might Be Giants, Joseph Arthur, Elvis Presley (reedições)
10 de Setembro: Animal Collective, Go! Team, Siouxsie Sioux, R Villalobos, Gravenhurst, Dot Allison, Kanye West, Sgt Pepperes (Tributo)
17 de Setembro: Thurston Moore, Edwin Collins, The Grid, Lou Rhodes, Murcof, Simon & Garfunkel (Live 1969). Manu Chao, Turin Brakes, David Bowie (reedição), Dead Or Alive (reedição), Debbie Harry
24 de Setembro: PJ Harvey, Devendra Banhart, Ian Brown, Múm, Pet Shop Boys, Scott Walker, Joni Mitchell,

Setembro: Lambchop, Mazgani, Joe Henry, Broken Social Scene, Siouxsie, U2 (DVD), Gorky’s Zygotic Mynci, Frank Black, Jona Lewie (reedição), Squeeze (reedições), Jose Gonzales, Iron & Wine
Outubro: Clã, David Fonseca, Madonna, Robert Wyatt, Junior Boys, Teddy Thompson, Sex Pistols (caixa de singles), Bob Dylan (best of), Annie Lennox, Dave Gahan, Bruce Springsteen, Beirut, Cloud Room, Fiery Furnaces, Underworld, Roisin Murphy, Lilac Time, Efterklang, Underworld, Mick Jagger (best of), Felix da Housecat
Datas retiradas de catálogos de editoras e lojas, contudo sujeitas a alterações
Novembro: Duran Duran, Sigur Rós, Sex Pistols (singles)


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