domingo, janeiro 21, 2007

Elogio da magia

Esquecemo-nos muitas vezes, mas é um facto: Woody Allen sempre convocou elementos mágicos para pontuar — ou mesmo inflectir — as suas teias narrativas. Por exemplo, não é verdade que a frieza sociológica do olhar de Manhattan (1979) rapidamente evoluía para outras paragens, em particular através da foto-grafia "expressionista" de Gordon Willis e da música transfiguradora de George Greshwin? E não é também verdade que muitos dos seus textos clássicos de stand-up comedy apontam para uma visão da condição humana em que a banalidade do quotidiano apela à sua decomposição mágica, nem que seja pelos instrumentos do absurdo?
No seu novo filme, Scoop, de novo rodado em Londres, Woody Allen reencontra Scarlet Johansson para encenar uma história quase burlesca em que a questão da magia se coloca de forma inveitavelmente irónica, mas também metodicamente de-sencantada. Entre ela (uma estudante de jornalismo que procura um tema "sensacionalista") e ele (um ilusionista cansado das suas próprias rotinas), desenvolve-se uma fábula social em que cada um é testado através das suas crenças e descrenças. Como é óbvio, entre os visados inclui-se o espectador — trata-se de saber se ainda estamos disponíveis para um cinema que supere as aparências do real sem cair nas rotinas dos efeitos mais ou menos "especiais" e nas modas mais ou menos "fantásticas". A resposta é afirmativa — diz-me a verdade com os teus truques.