quinta-feira, maio 18, 2006

O código da banalidade

Não li O Código Da Vinci. Nunca tive vontade de o ler. E agora não preciso mesmo de o fazer… Não gosto de policiais. Salvo excepções (raras) a sua escrita não me cativa. Mas ao ver o filme compreendi porque o livro de Dan Brown cativou tanta gente. E confesso que até me pareceu interessante a forma como engendrou a trama histórica que suporta a acção. A ideia de Jesus ter tido descendência, a existência de uma tradição de guardiães para esse segredo, de sucessivas tentativas de um conselho da Igreja que procura apagar do mapa esse potencial perigo, e a mais justificações históricas que tece, do reinado de Constantino à matança dos Templários, é matéria narrativa suculenta, incomoda e agarra atenções, mais que o jogo do gato e do rato que corre a história de fio a pavio. Contudo, já em A Última Tentação de Cristo, Martin Scorsese tinha levantado um cenário alternativo à vida de Cristo, que também ali casava e tinha filhos. Sendo que, a rematar o filme, Scoresese o devolvia à cruz, nunca explicada a sequência de vida “familiar” posterior à memória bíblica, se breve sonho de segundos, se facto rejeitado ao fim de anos, aceitando um destino maior, se mera tentação do diabo…
Agora há um mar de ideias e génio a separar Scorsese do “certinho” e flácido Ron Howard. E convenhamos que há mais matéria para reflexão e debate sobre a figura de Cristo e as fundações da fé cristã nesse filme de Scorsese que no livro de Dan Brown e sua (dizem-me) literal adaptação ao cimema. É claro que vai haver instituições incomodadas, almas incomodadas… Mas enquanto a proposta de Dan Brown/Ron Howard é mero exercício de ficção usando como matéria prima alguns pedaços de referências na história da Igreja, A Última Tentação de Cristo, que não deixa de ter o seu cunho ficcional, é antes uma visão pessoal sobre um homem, as suas dúvidas, as suas tentações, sem psicologia barata de self help, antes colocando perante nós a humanidade que certamente houve em Cristo e uma natural atitude de demanda interior, sem respostas fáceis.
E o novo filme? É apenas banal. Uma história com todos os ingredientes para garantir coices de atenção de cinco em cinco minutos, uma trama com o seu interesse, um elenco notável, imagens captadas em lugares que garantem pompa e circunstância (nunca contestando a identidade europeia da acção), todas as maravilhas de uma produção ensopada em muitos dólares… Mas uma realização ensopada em lugares comuns, frouxa e despida de personalidade. E uma banda sonora insuportavelmente fácil. Banal… Mas já vi bem pior este ano. Bem pior…

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