domingo, abril 30, 2006

Discos Voadores, 29 de Abril

Esta semana, os Discos Voadores aproveitam a passagem do documentário Leonard Cohen: I’m Your Man no IndieLisboa para fazer a sua homenagem ao músico, tal como no filme, através de canções por terceiros

Jim Noir “My Patch”
BC Camplight “Suffer For Two”
Faris Nourallah “Black Car”
Dead Combo “A Menina Dança?”
Morrissey “I Will See You In Far Off Places”
The Raconteurs “Steady As She Goes”
Pixies “I Can’t Forget”
Mates Of State “Fraud In The 80’s”
The Knife “Marble House”
Cristina “What’s A Girl To Do?”
Infadels “Girls That Speak No Words
The Sounds “Painted By Numbers”
X-Wife “Turn It Up”
Every Move A Picture “St John’s Night”
White Rose Movement “Girls In The Back”

Scissor Sisters “It Can’t Come Quickly Enough”
Spartak “King Tubby”
Jarvis Cocker “I Just Came To Tell You I’m Leaving”
Leonard Cohen “First We take Manhattan”
Rufus Wainwright “Chelsea Hotel”
That Petrol Emotion “Stories Of The Street”
John Cale “Hallelujah”
Nick Cave And The Bad Seeds “Tower Of Song”
Ian McCulloch “Lover Lover Lover”
Peter Astor “Take This Longing”
Leonard Cohen “Sisters Of Mercy”
JP Simões + Miguel Nogueira “Inquietação”
Secret Machines “All At Once”

Discos Voadores - Sábado 18.00-20.00 / Domingo 22.00-24.00
Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm

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sábado, abril 29, 2006

Trilogia de Nova Iorque (3)

Há muitos anos que não subia ao Empire State Building, "escalada" que normalmente se faz na primeira visita a Nova Iorque e, pronto, está visto… A coisa não mudou muito desde dessa visita de estreia, em 1987, com a grande diferença apenas constatada na falta das Torres Gémeas, que durante 30 anos roubaram ao velho Empire State o estatuto de “edifício mais alto de Nova Iorque”. Pormenor curioso de ignorância pós-11 de Setembro entre alguns que vivem em ansiedade permanente e ainda não consegue um olhar a frio sobre o mundo ao seu redor, uma professora a acompanhar um grupo de estudantes (estávamos em plena Spring Break) avisava que o acesso ao observatório do 102º andar estava fechado desde os ataques terroristas… Bastava-lhe olhar para o elevador de acesso, a levar quatro ou cinco pessoas de cada vez (porque se pagam 14 dólares adicionais para esses últimos 16 andares), para ver que estava redondamente enganada… E como este engano, muitos parecem ainda por esclarecer.
PS. A imagem principal deste post é um néon que se encontra no átrio dos elevadores do 80º andar do edifício.

É impossível estar alguns dias em Nova Iorque sem passar pelas salas de cinema, tantas que são as propostas oferecidas entre novidades e reposições. A cidade preparava-se para o Tribeca Film Festival, no qual foi feita a primeira ante-estreia de United 93. A chegada do primeiro filme sobre os ataques terroristas de 11 de Setembro foi um dos assuntos de que mais se falou na última semana em Nova Iorque. Publicaram-se sondagens sobre a vontade do cidadão americano em ver, já, um filme sobre os atentados (muitas delas com números a apontar mais respostas "não" que "sim"). Viram-se entrevistas com familiares dos que morreram nesse voo, e que aceitaram ser consultores do filme, apontando muitos United 93 como uma história de coragem, liberdade e patriotismo. As cautelas estenderam-se ao trailer, que, antes de mostrar imagens do filme, nos coloca perante uma voz que contextualiza, que explica como os familiares das vítimas foram escutados durante a produção. E que acaba a sublinhar que parte das receitas recolhidas seguirá para fundos de auxílio aos que perderam entes queridos naquele avião. O realizador Paul Greengrass sabia desde o início que tinha em mãos uma história sensível, para a qual nem toda a opinião pública americana está preparada. O argumento baseou-se nas gravações das últimas conversas telefónicas entre os passageiros sequestrados e os seus familiares. Apesar de algumas recusas, a maioria dos familiares dos passageiros aceitou colaborar, não só na produção, como nesta fase de preparação "pedagógica" de uma estreia que chega com todas as cautelas. Os familiares, e não os actores, são quem tem dado rosto às entrevistas televisivas, nas quais é recorrente o elogio ao realizador por ter usado nomes desconhecidos no elenco. "Ver o Brad Pitt a fazer de meu marido não faria sentido", dizia, há dias, a viúva de um dos heróis do voo 93 a um canal de TV.

A estreia mais mediatizada da semana foi American Dreamz (previsto para chegar às nossas salas em Maio), uma tentativa de comédia de terapia pelo riso contra a ameaça terrorista. O filme retrata uma América na qual há mais gente com vontade em votar em concorrentes de concursos televisivos (departamento reality show) que no Presindente. Este, em evidente paródia exagerada a Bush, é um fantoche que entra em depressão depois de reeleito, ao aperceber-se, lendo jornais e livros, que o mundo é bem mais complicado que o que lhe mostram nos briefings com desenhos. Para renovar a imagem do Presidente, o seu staff coloca-o como júri na final de um concurso tipo Ídolos, a cuja final chega uma loira ambiciosa, um judeu e… um árabe. Este não é mais que um terrorista “adormecido”, com hora de acordar apontada ao momento em que se encontrar, em directo, com o Presidente, devendo fazer-se rebentar com uma bomba, a si e ao inimigo. O filme não quer uma ser motor de uma reflexão sobre o estado das coisas, mas tropeça em facilidades superficiais, sobretudo na caricatura dos árabes, um deles com sonhos de Broadway, os restantes a vê-lo na TV, à noite, nas suas tendas algures num campo de treinos no Médio Oriente. Nem a crítica poupou o filme. Nem o box office se agitou… Tiro ao lado!

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Filme da Campari cita Kubrick e Bowie

O novo filme publicitário da Campari é um espantoso jogo de citações, cruzando O novo filme publicitário da Campari é um espantoso jogo de citações, cruzando Eyes Wide Shut de Kubrick com o teledisco de Boys Keep Swinging de David Bowie. O filme, The Secret, foi realizado por Tarsen, que já assinara para a Campari as campanhas The Scratch e The Duel. O novo The Secret foi filmado no luxuoso Praha Hotel (em Praga), tem por banda sonora The Masked Ball de Joycyn Pook (da banda sonora do citado filme de Kubrick), e cruza uma sequência de perseguição ao jeito da que o mascarado Tom Cruise faz nos corredores da estranha orgia que visita, com a cena da mão que borra a cara com batôn em citação directa do teledisco de 1979 Boys Keep Swinging (ideia que Bowie repetiu, aí através da co-protagonista, no teledisco de China Girl).
O filme da Campari pode ser visto aqui

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Beck e Jamie Lidell em digressão

Beck e Jamie Lidell vão fazer uma digressão conjunta. Para já, a dupla vai estar em palco, em double bills (ou seja, concertos dois-em-um) em oito datas nos Estados Unidos entre finais de Maio e inícios de Junho. Beck tem, entretanto, uma série de concertos em nome próprio marcados para palcos americanos e europeus entre finais de Junho e o mês de Agosto. Os concertos europeus estão, para já, marcados entre os dias 11 e 24, janelas ainda aberta para eventuais passagens por Paredes de Coura ou, mais provavelmente, Sudoeste. Atenção, que uma possível passagem por estes lados não passa, neste momento, de wishful thinking deste blogue…

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sexta-feira, abril 28, 2006

Trilogia de Nova Iorque (2)

Não há visita a Nova Iorque que não peça uma passagem pelo CBGB, velhos hábitos a que só a ordem de despejo, que se cumprirá no fim do Verão colocará inevitável ponto final. A ementa de concertos na última semana não era particularmente entusiasmante, mas nunca a casa esteve vazia, transformada que está (sobretudo para os forasteiros) em altar de romaria obrigatório para todos os que ali reconhecem um espaço de dimensão “bíbilica” na história da cultura rock’n’roll. Na porta ao lado, o CB’s Gallery, que abre as portas logo pela manhã, podemos encontrar memorabillia e merchandise relativos ao clube. T-shirts e outras gracinhas de trazer para casa, discos em vinil (um deles, de finais de 70, com gravações inéditas no palco do CBGB, com bandas como os Shirts, Mink DeVille ou Tuff darts, CDs, DVDs, palhetas-chaveiro, e o que mais se quiser. Trouxe uma dose renovada de T-shirts e os álbuns em vinil… Mas a gracinha foi o saco no qual me foram dadas as compras… Um saco daqueles tipo loja chique de roupa, com o logo do CBGB a prateado… Nem o Studio 54 faria melhor!

O tom inesperado e algo desajustado daquele saco de jeito chique numa loja ligada ao clube que é merecidamente reconhecido como a “casa do rock underground” fez franzir o sobrolho do dono da Rebel Rebel, a minha loja de discos de colecção favorita em Manhattan… Olhou para o saco, sem saber como reagir… A conversa rapidamente mudou para o assunto de sempre: David Bowie (o nome da loja não engana quem nela entra, nem os singles e capas de revistas na parede). A Rebel Rebel, no número 319 da mui recomendável Bleeker Street (precisamente nas traseiras do quarteirão onde se encontra a mítica tabacaria Village Cigars) é uma das mais bem fornecidas lojas de discos em vinil e novidades em CD para gostos pop/rock alternativos, clássicos e com afinidades com a cultura pop britânica. Pelas paredes vêm-se velhos números da Mojo, da velha Face, da Q… Singles de Patti Smith, Bowie, Joy Division (o EP An Ideal For Living marchou no momento). Há álbuns em vinil dos nomes de referência de 60 a 80. E vasta oferta em singles, sobretudo de… Bowie, claro! Atenção ainda aos livros, sobretudo os que já não se encontram nas prateleiras das livrarias. No ano passado tinha por lá encontrado um soberbo estudo musicológico sobre a obra de Brian Eno. Este ano, o catálogo de uma histórica exposição de capas de disco de Vaughan Oliver…


Quando se tem algum tempo em Manhattan, e se gosta de livros, há que passar pelas grandes lojas generalistas, como a Borders, a Barnes And Noble ou (a minha preferida) Shakespeare And Company (nada relacionada com a livraria com o mesmo nome e historial que remonta ao século XIX nas margens do Sena, frente a Notre Dame, em Paris). Contudo, aconselha-se passagem pela Strand, uma espécie de Barateira lá do sítio, mas com oferta que não se esgota em segunda mão, muitos sendo os livros com alguns meses de edição que ali se encontram, no mínimo, a metade do preço. A Strand, que usa como frase de apresentação a convidativa expressão “18 miles of books”, tem duas lojas, uma no número 828 da Broadway (junto da rua 12) e outra no número 95 da Fulton Street, rua de comércio entre o ‘ground zero’ e o agitado South Sea Port. As livrarias são enormes e bem arrumadas. Na secção de música (paragem obrigatória, sempre), uma das descobertas da viagem: Playback, de Mark Coleman, uma história tecnológica da música que relaciona os aparelhos de gravação e reprodução de som com a música que a cada nova década se foi criando, dos dias do fonógrafo ao mp3… Um olhar sério que nos obriga a reconhecer que nem só da criatividade pura viveu a história da música, desde que começou a ser gravada.

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Jesus & Mary Chain reeditados

A quase totalidade da discografia em álbum dos Jesus & Mary Chain vai ser reeditada com extras. Os álbuns vão ser lançados em dual disco, a face CD contendo os discos em versões remasterizadas, a face DVD juntando telediscos ao áudio integral dos mesmos registos, mas em som de alta definição. Alguns destes álbuns, sobretudo os dois primeiros, são peças fundamentais na história pop de 80, e ainda hoje decretam descendências. Aqui fica a lista dos telediscos extra nos discos a editar:

Psychocandy (1985): Just Like Honey, Never Understand, You Trip Me Up

Darklands (1987): Darklands, Happy When It Rains, April Skies

Automatic (1989): Blues From A Gun, Her Way Of Praying, Head On

Honey’s Dead (1992): Reverence, Far Gone And Out, Almost Gold

Stoned & Dethroned (1994): Sometimes Always, Come On, Snakedriver

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Este fim de semana na Radar

Álbum de Família. Esta semana escuta-se Anjo da Guarda, o álbum de estreia de António Variações, em 1983. É o primeiro disco português a ouvir-se no Álbum de Família.
Domingo, 12.00

Discos Voadores. A propósito da passagem no IndieLisboa do filme I’m Your Man, dedicado a Leonard Cohen, um percurso pelas canções do músico canadiano, sobretudo através de versões por terceiros, como Rufus Wainwright, John Cale, Peter Astor ou Nick Cave.
Sábado 18.00 / Domingo 22.00

Este sábado e domingo não há “Fala Com Ela”, que regressa na próxima semana.

Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm

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quinta-feira, abril 27, 2006

Trilogia de Nova Iorque (1)

Uns dias em Nova Iorque explicam o silêncio de alguns dias neste blogue, som e visão devidamente repostos desde ontem. Dias naturalmente passados avenidas acima, avenidas abaixo, ruas a leste ruas a oeste, com parte substancial do tempo, como sempre, entre o Greenwich Village (sobretudo a irresistível Bleeker Street, casa de algumas das melhores lojas de discos da cidade), o East Village, o Soho e TriBeCa. Livros muitos, DVDs idem idem, CDs também, nem todos com lançamento previsto por estes lados, mas dos quais aqui se dará notícia. A abrir uma série de posts nova-iorquinos, uma imagem viva de Times Square que, apesar de ex-libris de NYC, lembra sempre mais Tóquio que a grande maçã… Basta depois olhar para os cartazes dos musicais que moram nas imediações, entre a rua 42 e 49, entre a oitava avenida e a sétima, Broadway pelo meio, para nos assegurarmos que estamos no sítio certo.


Etapa protagonista da viagem (e seu motivo principal), os concertos dos Scissor Sisters no Bowery Ballroom, uma velha sala de danças com todos em Delancey Street, zona Norte da degradada Chinatown, mas onde não faltou a nata da celebridade local, Cher entre as mais destacadas presenças na pequena sala para 498 lugares (sim, número preciso indicado num cartaz à entrada). A banda interrompeu, por dois dias, os trabalhos de gravação do seu segundo álbum, que entretanto retomaram para poder assegurar lançamento no fim do Verão. Os concertos foram, ostensivamente, de apresentação (leia-se teste) das novas canções, com um total de oito inéditos escutados num serão de 15 canções. Belíssimas surpresas sobretudo em I Can’t Decide, um híbrido pop viçoso e luminoso que nasce entre a country e o vaudeville, e desde já candidata a ser uma das melhores canções do ano. Muito boa ainda If You Want These Lips, um cruzamento de glam rock com electrónica que vai ser festa em disco e ao vivo. Aplauso também para a sólida balada que é Land Of A Thousand Words, evocação directa das memórias de Elton John nos anos 70 (e milhas acima da apenas morninha Mary). Das oito canções novas destacou-se uma evidente presença protagonista de temperos glam, mas as marcas de identidade do álbum de estreia, o disco sound à Bee Gees (bem evidente em I Don’t Feel Like Dancing) e um rock vivo e festivo dominam a oferta. Quanto à questão de que se fala, ou seja, quem é o convidado “mistério” do álbum, as dúvidas mantém-se. Há uma canção, que creio chamar-se The Other Side, que tresanda a Roxy Music de finais de 70 (ou seja, será Bryan Ferry?)… Mas na folha de alinhamento, no chão do palco, um dos temas vinha apenas citado como Paul McCartney… Será o título da canção? Ou o do convidado? Ficamos à espera da resposta… Quanto à reportagem completa, podem contar com ela, brevemente nas páginas da ‘6ª’, no DN.
A imagem do concerto neste post foi tirada do fórum do site oficial dos Scissor Sisters, assinada por Missmodernage.


Entre as leituras desta viagem um pequeno livro da série 33 1/3, dedicado ao álbum de estreia dos Ramones. Leitura certa no lugar certo e a revelação de um dos melhores títulos da série, capaz de contextualizar o nascimento do punk nova iorquino no seu lugar e tempo, justificando-o, por oposição ao punk britânico como um fenómeno de características sociais menos sombrias, e com relação directa entre uma tradição de ligação entre a alta e baixa cultura, que Andy Warhol e suas ramificações inscreveram na história cultural da cidade. E, claro, não falta neste retrato, e sobretudo tratando-se do caso Ramones, a constatação de que um sentido de humor muito peculiar dominou a génese de um movimento que, contra a memória politizada da geração hippie de finais de 60, nem quis ser político (o livro desmonta até as iconografias nazis da época) nem transformou os seus fiéis em crentes de dogmas niveladores e silenciadores da diferença. Pelo contrário, e como poucos outros movimentos culturais pop, o punk promoveu a individualidade, a identidade, a afirmação da diferença. O autor, Nicholas Rombes, é professor de inglês numa universidade em Detroit, mas faz do seu olhar sobre o punk, os Ramones e a Nova Iorque de 1974 a 76 um espaço de leitura contagiante, de imagens claras e expressivas, e sem qualquer manifestação de academismo. Brilhante!

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Depeche Mode editam 50 álbuns ao vivo

Os Depeche Mode anunciam a edição, limitada, de 50 discos ao vivo da sua digressão Touring The Angel. São edições fulminantes, a entregar ao fim do respectivo concerto em formato de CD duplo, ou a descarregar depois por donwload, sendo que a versão “física” conta como atractivo extra um package de luxo, com fotos inéditas e exclusivas de Anton Corbijn. O primeiro concerto da digressão a ser transformado em disco é o que tem hoje lugar no Shoreline Auditorium, na Califórnia, segundo-se uma série de datas nos EUA e, claro, as europeias, entre as quais Lisboa. Estas edições nada têm a ver com o registo oficial ao vivo da digressão, a editar em CD e DVD no fim fo ano pelos Depeche Mode.

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quarta-feira, abril 26, 2006

Discos da semana, 24 de Abril

Secret Machines “Tem Silver Drops”
Os Secret Machines não são estreantes. Mas com o novo Ten Silver Drops têm reunido a quase unanimidade de opiniões favoráveis entre a imprensa musical de ambos os lados do Atlântico, e contam agora entre os seus mais fiéis admiradores David Bowie, que os começa a apadrinhar com a mesma energia e disponibilidade como, nos anos recentes, o vimos fazer com os Yeah Yeah Yeahs e, mais visivelmente ainda, com os Arcade Fire. Neste seu segundo álbum mostram sinais de mais profunda depuração de elementos fora de órbita, afinando a pontaria rumo a uma música com fôlego e ambição, que parte da memória dos Pink Floyd de inícios dos anos 70 mas que, sem objectivos retro, junta ao caldeirão temperos adicionais captados entre experiências mais recentes, de farrapos de trabalho vocal a lembrar os Jane’s Addiction a breves flirts com a “armadilha” Coldplay (felizmente localizados, curtos e sem consequências perigosas), sem esquecer a mais visível de todas as marcas actuais: a evidente, euforia-furacão de uns Arcade Fire, que aqui conhece segura descendência. O disco mostra uma banda em processo de afirmação de uma maturidade na escrita e interpretação, e sem receio de deixar claras quais as genéticas que hoje alimentam a sua demanda. As canções de Ten Silver Drops são meticulosas obras de visão e ambição, grandiosas nos arranjos, complexas na arte final, mas nunca deslaçadas, nunca perdidas em devaneios maiores que a capacidade de os suportar e moldar (o que se viu, por exemplo, e com os piores resultados, no recente e desapontante At War With The Mystics, dos Flaming Lips). Apesar da grandiosidade que ostentam, da eloquência dos elementos e sua disposição no espaço, conseguem não perder nunca a ideia estrutural da peça que nasce pop e, mesmo vestida em loja de gostos requintados, nunca deixa de ser o que é. Estas são canções seguras de si, cheias de histórias sombrias, feitas de cenografias quixotescas, de excessos controlados, mas que não perdem nunca a sua estrutura primordial. De resto, a alma e força do disco reside precisamente no facto deste se mostrar como um álbum de canções pop que se mascararam, e bem, com sumptuosos trajes progressivos.

Gnarls Barkley “St Elswhere”
Num momento em que, apesar das pontuais excepções, o panorama global “pop” e hip hop parecia algo estagnado, è espera do episódio seguinte, a resposta parece ter sido encontrada na criação de um novo híbrido que pisca ostensivamente o olho ao hip hop, mas que faz questão de afirmar a canção pop como pilar estrutural da sua identidade, temperos diversos depois usados nas artes finais, da soul ao rock, e o que mais o gosto quiser usar. Canções como 19/2000 de uns Gorillaz, Hey Ya! Dos Outkast ou When You Wasn’t Famous dos The Streets são apenas alguns entre os exemplos de uma nova pop viçosa, luminosa, atraente, capaz de importar do hip hop os elementos necessários para renovar uma ideia de prazer para três minutos de voz e música que tem sido a célula fundamental da música popular. A mais recente proposta neste departamento chega através do projecto que reúne o mediático (com feitos justificados) DJ e produtor Danger Mouse com Cee-LO. Juntos chamam-se Gnarls Barkley, somaram primeiras notícias por terem feito do seu single Crazy o primeiro, da história, a chegar ao número um do top inglês apenas com vendas por download. Continuam a ser notícia por manter, até agora, o mesmo Crazy no primeiro lugar (feito raro nos dias de hoje). E são-no uma vez mais com St Elswhere, um álbum de estreia no qual estendem a um alinhamento de 14 temas a ideia de uma pop festiva, arquitectonicamente suportada por estruturas herdadas do hip hop, e para o qual convergem depois referências soul, a memória pop da Motown, ou mesmo heranças indie de 80, estas materializadas numa quase canónica versão de Gone Daddy Gone dos Violent Femmes. Porém, e apesar da excelência de Crazy, da bela versão e de algumas pontuais canções que dá vontade de ouvir vezes sem conta, a ideia é por vezes melhor que a concretização. E o álbum acaba num limbo entre momentos de puro encanto e faixas claramente menores. Também aqui um híbrido, portanto…

António Variações “A História de António Variações – Entre Braga e Nova Iorque”
Ano e meio depois de editado o álbum dos Humanos, no qual o grupo reconstruiu (à sua maneira e gosto) uma série de inéditos encontrados na colecção pessoal de cassetes áudio de António Variações na forma de esboços, maquetes caseiras ou meras vinhetas, a meteria prima que gerou esse disco, assim como outros ensaios encontrados e catalogados nessa colecção de cassetes, permitem a construção de uma “integral” do cantor. A grande novidade deste disco é a inclusão de uma maquete, gravada em estúdio, com banda, do histórico Toma O Comprimido, que poderia ter sido o single de estreia de António Variações em 1981. Dessa mesma sessão é aqui incluído o respectivo eventual Lado B, o tema Não Me Consumas, que os Humanos recuperaram. Junta-se, ainda de inédito, maquetes de Muda de Vida, Maria Albertina e Quero é Viver, uma gravação caseira, com Francis, de Deolinda de Jesus e uma gravação ao vivo, no Rock Rendez Vous, de Anjo da Guarda. O CD, duplo, recolhe a integral de estúdio de António Variações (os dois álbuns e o single Estou Além/Povo Que Lavas No Rio). E para cada tema em estúdio, apresenta-se, um excerto de uma maquete ou ensaio da respectiva canção.
PS. Estando pessoalmente envolvido neste projecto não emito aqui qualquer opinião sobre este disco.

Fiery Furnaces “Bitter Tea”
Os Fiery Furnaces já nos deram exemplos da melhor escrita, sobretudo no conjunto de canções que compilaram no obrigatório EP do ano passado. Porém, transportam no seu sangue uma tendência para o desnorte e anarquia que nem sempre dá os melhores resultados. O seu disco anterior era entediante manobra de autismo, parecendo o novo Bitter Tea um regresso a um espaço onde a comunicação com o exterior parece novamente na agenda do duo. As electrónicas são as ferramentas ao serviço de canções onde se respiram as heranças pop de que os Fiery Furnaces gostam de assimilar na sua escrita, mas onde as marcas de liberdade formal “avariam” saudavelmente quaisquer cânones que essas memórias possam convocar.

Também esta semana: British Sea Power, Thievery Corporation, Moloko (best of), The Dears, Tortoise, Gun Shys, The Cure, k.d. Lang

Brevemente:
1 de Maio: Basement Jaxx, Pearl Jam, Gomez, Scritti Politti, Teats For Fears (reedição), PJ Harvey (DVD), Futureheads, Protocol,
8 de Maio: Red Hot Chilli Peppers, The Raconteurs, Lisa Germano, Bruce Springsteen, Grandaddy, Matmos, Roddy Frame, The Stills

Maio: Pet Shop Boys, Clear Static, Only After Dark (compilação pós-punk), Radio 4, Boy Kill Boy, Hot Chip, Outkast, Basement Jaxx, Gomez, Grandaddy, Lisa Germano, Matmos, Roddy Frame, Fatboy Slim (best of), Frank Black, Muse, Zero 7, Sex Pistols (reedição), William Orbit, Spiritualized, Death From Above 1979, Velvet Underground (antologia), Elvis Costello + Allen Toussaint

Discos novos ainda este ano: Primal Scream (Junho), B-52’s, Björk, Beyoncé, Blur, Bryan Ferry, Cornershop (Maio/Juho), Damon Albarn (Verão), David Bowie (Junho), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Duran Duran (Verão), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Maio/Junho), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Junho), Michael Nyman (Maio/Junho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Outkast, Paul Simon, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters, Sisters Of Mercy, Madonna (Lisboa ao vivo DVD), New York Dolls (DVD)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Björk, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição).

Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.

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sábado, abril 22, 2006

Discos Voadores, 22 de Abril

Esta semana, a assinalar a passagem no IndieLisboa do documentário Screaming Masterpiece, um panorama pela música que hoje se faz na Islândia.

Marisa Monte "Gerânio"
Arcade Fire "Brasil"
Secret Machines "All At Once (It's Not Important)"
BC Camplight "Suffer For Two"
Melnyk "The Art Of Seduction"
The Knife "Marble Hours"
Merz "Verily"
Sigur Rós "Hoppiopla"
Cindy Kat "Gloria"
PIL "Rise"
X-Wife "Turn It Up"
White Rose Movement "Girls In The Back"
Every Move A Picture "St John's Night"
She Wants Revenge "Red Flags And Long Nights"

Dead Combo "A Menina Dança?"
Rufus Wainwright "Chelsea Hotel"
Daniel Johnston "Syrup Of Tears"
Bang Gang "Find Out Why"
Jeff Who? "The Morning After You"
Gus Gus "Starlovers"
Björk "All Is Full Of Love"
Múm "Green Grass Of Home"
Amina "Fjarskanistan"
Sigur Rós "Vidrar Vel Til Loftárása"
Johann Johansson "Odi et Amo"
Sugarcubes "Motorchrash"
António Variações "Toma O Comprimido"
Morrissey "I Will See You In Far Off Places"

Discos VoadoresSábado 18.00 - 20.00 / Domingo 22.00 - 24.00
Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm

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quarta-feira, abril 19, 2006

She Wants Revenge em Lisboa!

Os She Wants Revenge vêm a Lisboa a 22 de Julho, integrando o cartaz de um dos “festivais” que mais dá vontade de ver, entre os já anunciados para a temporada. A banda, que acabou de editar entre nós o seu álbum de estreia, vai tocar na mesma noite em que os Strokes, finalmente com data agendada para um palco português. Boas notícias. Tão boas como as, já aqui referidas, das estreias dos Editors e White Rose Movement entre nós, os primeiros integrados na programação do SBSR, os segundos em Paredes de Coura.
Próximas sugestões a promotores de festivais: Clap Your Hands Say Yeah, The Knife, Hot Chip, Kelley Polar, Richard Swift, Sufjan Stevens, Architecture In Helsinki, Yeah Yeah Yeahs, Morrissey… Pode ser?

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Remodelações: sim ou sopas

Nem sempre as “renovações gráficas” dão bons resultados. E o que aconteceu, nestas últimas semanas, com a Les Inrockuptibles e a Uncut, publicações com grande projecção (e ambição de o continuara a ser) mostra como se pode fazer o melhor… ou o pior.

Comecemos pela Uncut. Com 108 meses de vida, a revista britânica continua firme numa ideia centrada na música, mas ciente de que o cinema e os livros são periferias de interesse para o seu target. A renovação gráfica é mais ostensiva na capa (até o logo teve ordem de mudança) que no corpo da revista, que continua bem paginada, com saudável equilíbrio entre texto e imagem, e sem quaisquer mudanças na sua linha editorial. De novo há uma sequência de abertura com trivia e pequenas entrevistas, histórias, curiosidades, comparações… Com bom gosto, imaginação, humor q.b. As críticas de discos passam a ser arrumadas por ordem alfabética, baralhando novas edições e reedições (a antiga separação, na verdade, ajudava a arrumar as ideias…). O cinema é concentrado na recta final da paginação. Mais um lifting quer um peeling, uma boa revisão, sem danificar a personalidade de uma revista que consegue um bom jogo que equilíbrio entre o que é actual e a memória, entre a música e o cinema, o alternativo (sem excessos de nichos, o que se justifica numa revista de ambição de boa performance num certo segmento de mercado) e o mainstream digerível (sem escorregar nunca para os disparates que transformaram a Q numa espécie de RFM do jornalismo musical britânico). Hoje há revistas bem mais interessantes que a Uncut no departamento pop/rock. A Paste, a Under the Radar, a Comes With A Smile… Isto na oferta "alternativo e periferias", sem entrar em campos de maior especialidade e de nicho, onde não falta boa leitura. Mas a Uncut continua a justificar um lugar entre as publicações de referência no panorama pop global.

Algo completamente se deverá dizer da nova Les Inrockuptibles. Enfermando daquela mania de querer ser rebelde e não tomar banho, a Les Inrocks, até aqui uma das interessantes publicações do meio, por cruzar inteligente música, cinema, livros e demais artes, resolveu agora ter uma secção de abertura... política. Como se não bastassem já as irregulares ansiedades não-pop da Rolling Stone! Como se não houvesse já suficiente jornalismo político (e até mesmo de política cultural) que chegasse. Em França, em função da cor (política) do leitor, há o Le Monde ou o Liberation… E mais além... Para quê, então, uma abertura agit prop na Les Inrocks? Sobretudo se a dose obriga a evidentes cortes no espaço para a música, o cinema, os livros. Ou seja, os motivos pelos quais se comprava a revista e não outras publicações. Não fossem os CDs de antecipação das temporadas e pontuais bons dossiers, passava já para o departamento das memórias (como a Q)… Em francês, pop, nada como, hoje, a Magic! Ah, o novo grafismo da Les Inrocks nem é mau. Mas com esta actual política editorial, nem com design de galeria de arte!

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Little Pet Shop Britain Boys

Aconselha-se uma visita ao Planeta Pop (ver link na barra lateral deste blogue), onde já se pode ver o brilhante teledisco do novo single dos Pet Shop Boys, I’m With Stupid. Neil Tennant e Chris Lowe surgem apenas na sequência final, deixando todo o protagonismo do teledisco por conta de David Walliams e Matt Lucas, ou seja, os criadores de Little Britain, que aqui parodiam sobretudo a memória dos vídeos que, em 1993, ows Pet Shop Boys rodaram para acompanhar Can You Forgive Her? e Go West. Imperdível!
O teledisco assinala a aproximação de Fundamental, um álbum gravado sob produção de Trevor Horn, com data de edição apontada a meados de Maio. Pela amostra, espera-se um reencontro com a velha identidade épica sinfónica em diálogo com a tecnologia electrónica dos dias de It’s A Sin… Expectativas em alta…

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Uma noite perfeita...

A morte de Sterling Morrisson, em 1995, colocou irremediável ponto final a nova ideia de possível reunião dos Velvet Underground, tendo a sua inesperada digressão de 1993 representado oportunidade única para os reencontrar em palco e aí os registar novamente ao vivo. Assim aconteceu, por três noites num Olympia (Paris) esgotado para redescobrir canções que marcaram a história da música popular. O filme, em tempos lançado em vídeo, tem agora edição em DVD, revelando à era digital um soberbo espectáculo de uma banda performativamente amadurecida e que, embora pouco comunicativa (sobretudo entre si) consegue fazer-nos esquecer, pelo magnífico concerto em palco, a débil realização (que, todavia, não perde oportunidade para espreitar a pose, única, de Moe Tucker na bateria). No ecrã passa um soberbo alinhamento best of, com Cale e Tucker a roubar pontualmente o protagonismo vocal a Lou Reed. Mas nem mesmo o mais distraído sente que não há cachimbo da paz possível entre aqueles quatro músicos. E no final, quando Reed abraça Cale, este não responde. E nunca mais se juntaram. Este é, sem dúvida, um daqueles raros DVDs musicais que vale mesmo a pena ter em casa.
Versão não editada de texto publicado no DN

Este fim de semana na Radar

Fala com Ela. Maria João Vicente, do Teatro da Garagem, fala da nova peça, À Procura de Júlio César. E traz alguns discos...
Sábado 12.00 / Domingo 17.00

Álbum de Famíla. Esta semana, um clássico da canção com autor, Astral Weeks, de Van Morrisson.
Domingo 12.00

Discos Voadores. A assinalar a passagem, no Indie Lisboa, de Screaming Masterpiece, um panorama sobre a música que hoje se faz na Islândia.
Sábado 18.00 / Domingo 22.00

Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm

segunda-feira, abril 17, 2006

Discos da semana, 17 de Abril

White Rose Movement “Kick”
Enquanto se espera sobre a decisão favorável a um licenciamento de Kick para Portugal, a edição internacional do álbum de estreia dos White Rose Movement não deixa de ser o acontecimento musical pop da semana. O disco confirma em pleno a visão pop de Love Is A Number, a força rock de Alsatian e o apelo dançável e viciante de Girls In The Back, três singles que, editados ao longo dos últimos meses, nos deram sucessivos sinais de alerta para um nome a acolher com atenção. Kick é tudo o que esses singles sugeriam, e mais. É um álbum ciente de uma carga genética herdada sobretudo no ideário pós-punk mais sombrio de finais de 70 e inícios de 80 (Joy Division à cabeça das referências), mas junta-lhe uma luz e cor pop que contrasta com as sombras dominantes, e uma pujante vitalidade rítmica que convida ao movimento. Logo desde o lançamento do seu primeiro single, há largos meses, ficou claro que entre os White Rose Movement iríamos encontrar um dos mais coesos álbuns de estreia da nova geração “novo rock”, capaz de se perfilar junto das não distantes estreias de uns She Wants Revenge ou Editors como disco a reter, e tão capaz de captar admiradores como o fizeram os Interpol e The Killers. De todos, os White Rose Movement são os que mais bem mostram um jeito peculiar em conciliar extremos, pop festiva e neura pós-punk, luminosidade positiva e raiva para electricidade, baixo e bateria, teclas aprumadas e angulosidade rítmica. O disco junta ao single uma série de novos temas que prometem fazer carreira, como Test Card Girl, ou uma nova versão de Pig Hale Jam. Quaisquer dúvidas poderão ser esclarecidas, ao vivo, em Paredes de Coura…

The Knife “Silent Shout”
Há muito que se não escutava um álbum de canções feitas exclusivamente sob confecção electrónica no qual as marcas de autor suplantam e quase apagam as referências e heranças mais óbvias (estas sendo as memórias de Björk nos bons dias de Debut, da ansiedade Le Tigre, de um gosto pelo trabalho das texturas como os Radiohead na fase Kid A/Amnesiac, do sentido de desconforto da voz de uma Siouxsie Sioux nos seus primeiros tempos). Silent Shout é um espaço de sombria expressão de um interior que somos forçados a descobrir nas entrelinhas das palavras e nas sugestões plásticas de uma música que não perde tempo com decorações supérfluas. Este é um caso sério de electrónica com atitude. Fria, espartana nos recursos e formas, plena de sentidos e intenções nas palavras, mas absolutamente capaz de assombrar pela visão, pela ousadia, pela personalidade. Esta é uma música de tons escuros, e nem mesmo quando a estrutura rítmica sugere o movimento ousamos fazer a festa. Silence Shout faz-se de uma música precisa, mecânica, contida, exacta. Negra, mas ciente de um humor subliminar que impede que mergulhemos numa ode pop à desgraça pós-moderna, antes procurando a sugestão de um domínio de sensações que imaginamos filmadas por um David Lynch ou Chris Cunningham. O disco é um mundo de surpresas a cada nova faixa e um daqueles raros casos de inexistência do mais ténue esboço de tédio ao longo de todo o seu alinhamento.

Philip Glass “Symphony No. 6”
Com subtítulo The Plutonian Ode, respeitando na íntegra o poema anti-nuclear de Allen Ginsberg, esta “sexta” não foge à linha de trabalhos sinfónicos recentes de Philip Glass, apresentando o texto cantado por um soprano (Lauren Flanigan). Na música, originalmente nascida para piano, mas adaptada depois para a dimensão de uma orquestra, Glass tenta explorar novas texturas e elementos dissonantes nos primeiros e segundo andamentos, retomando no terceiro um processo de construção aditiva mais familiar, todavia com alguns resultados refrescantes. O trabalho vocal, todavia, enferma de uma escrita obsessiva que tem dominado alguma da obra cantada (sobretudo operática) de Glass nos últimos tempos, sobretudo quando recorre a sopranos, obrigando-os a um registo no limite, sem espaço para tréguas. O álbum, duplo, apresenta no segundo disco uma versão alternativa desta sinfonia, com a própria voz de Allen Ginsberg a ler o seu texto sobre a orquestra e canto.

Philip Glass “Symphony No. 8”
Capaz de se colocar, junto da sua genial 5ª sinfonia, entre as melhores obras de Philip Glass, a recente Oitava Sinfonia (2005) é uma surpresa, e está a arrebatar entusiasmos mesmo junto dos mais cépticos da sua música. É uma peça longa, exclusivamente instrumental, pensada na linha das sinfonias concertantes características do período clássico, permitindo visibilidade protagonista a diversos instrumentos. É uma sinfonia de rumo sempre inesperado, com mudanças cromáticas, desafios na fluente melodia e surpresa a cada novo momento, contrariando algumas das características mais recorrentes da obra recente de Philip Glass. Estão lá as marcas do minimalismo que lhe é estrutural, mas há respiração diferente e uma sensação de mudança de ares que lhe dá, como no soberbo Orion editado no ano passado, sinais de que há novos caminhos ainda a trilhar por estas bandas

Vários “Exit Music”
A unanimidade que conseguiram em finais de 90 com OK Computer e as visões que nos deram depois com o díptico Kid A/Amnesiac fizeram dos Radiohead um dos raros nomes de escola rock a comunicar fluentemente com outros músicos e outras músicas. Depois de versões para piano por Brad Mehldau e outras aventuras, a resposta de além rock chega neste tributo, no qual nomes como Herbert, RJD2, a Cinematic Orchestra e alguns mais se entretém a reinventar a música dos Radiohead. A ideia até parece interessante à partida, mas acaba por revelar mais olhos que barriga, num desfile de versões frouxas, desinteressantes. Excepção para Just, por Mark Ronson, onde a pujança rock cede vez a uma estrutura hip hop em flirt pop.

Também esta semana: Protocol, Dizee Rascal, Bananarama (best of), Faris Nourallah (reedição), Ronnie Spector, Zutons, Charlatans, Miss Kittin, Madonna (remisturas, apenas em vinil)

Brevemente
24 Abril: António Variações (integral de estúdio), Fiery Furnaces, Gnarls Barkley, Futureheads, Red Hot Chilli Peppers, Air (colaborações), British Sea Power, Thievery Corporation, Moloko (best of), The Dears, Tortoise, The Rakes, Gun Shys, Cure, k.d. Lang, Protocol, Secret Machines
1 de Maio: Basement Jaxx, Pearl Jam, Gomez, Scritti Politti, Teats For Fears (reedição), PJ Harvey (DVD)

8 de Maio: The Raconteurs, Lisa Germano, Bruce Springsteen, Grandaddy, Matmos, Roddy Frame, The Stills

Maio: Pet Shop Boys, Clear Static, Only After Dark (compilação pós-punk), Radio 4, Boy Kill Boy, Hot Chip, Outkast, Basement Jaxx, Gomez, Fatboy Slim (best of), Frank Black, Muse, Zero 7, Sex Pistols (reedição), William Orbit, Spiritualized, Death From Above 1979, Velvet Underground (antologia), Elvis Costello + Allen Toussaint

Discos novos ainda este ano: Primal Scream (Junho), Every Move A Picture, B-52’s, Björk, Beyoncé, Blur, Bryan Ferry, Cornershop (Maio/Juho), Damon Albarn (Verão), David Bowie (Junho), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Duran Duran (Verão), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Maio/Junho), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Junho), Michael Nyman (Maio/Junho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Outkast, Paul Simon, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters, Sisters Of Mercy, Madonna (Lisboa ao vivo DVD), New York Dolls (DVD)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Björk, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição).


Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.

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domingo, abril 16, 2006

Discos Voadores, 15 de Abril

Esta semana os Discos Voadores apresentam mais um episódio de “discos perdidos”, recuperando o álbum Cardiffians, o segundo da dupla Devine & Statton, em 1990. Ela, Alison Statton, foi a vocalista dos míticos Young Marble Giants, em inícios de 80.

The Raconteurs “Steady As She Goes”
Cindy Kat “Miudo”
Flaming Lips “Yeah Yeah Yeah Song”
She Wants Revenge “Red Flags And Long Nights”
X-Wife “Ping Pong”
White Rose Movement “Girls In The Back”
Pet Shop Boys “I’m With Stupid”
The Streets “When You Wasn’t Famous”
Gnarls Barkley “Gone Daddy Gone”
Devine + Statton “Bizarre Love Triangule”
Gonzales + Feist + Dani “Boomerang 2005”
Kelley Polar “My Beauty In The Moon”
Stereolab “Vodiak”
Droolian (Julian Cope) “Jellypop Perky Jean”
The Weatherman “If You Only Had One Wish”
Spin Hour “First Take”

Melnyk “The Art Of Seduction”
Spartak “King Tubby”
The Knife “Marble House”
Devine + Statton “Enough Is Enough”
Devine + Statton “Lovers Get In The way”
Devine + Statton “A Fact Of Life”
Young Marble Giants “Searching For Mr Right”
La Varieté “Drum Beat For Baby”
Devine + Statton “We Deserve It”
Devine + Statton “Crestfallen”
Devine + Statton “In The Rain”
Alison Statton + Spike “Mr Morgan”
Devine + Statton “Regina And Michael”
Morrissey “You To Me Are A Work Of Art”
ByPass “Ashford”
Bell Orchestre “The Upwards March”


Sábado 18.00-20.00 / Domingo 22.00-24.00
Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm

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Os fabulosos Rutles!

Cantam W.C. Fields Forever e I Am The Waitress. Em 1967 deram ao mundo Sgt. Rutters Only Darts Club Band, álbum que gravaram sob a influência de chá, que lhes fora apresentado por Bob Dylan, e que depois tentaram legalizar. Rodaram filmes como A Hard Day’s Rut, Ouch! Ou Tragical History Tour. E, depois da separação, uns abriram salões de cabeleireiro, enquanto outros deram conferências de imprensa sobre a paz no mundo dentro do chuveiro. O logótipo da empresa que abriram para gerir as suas finanças, a Rutle Corps, era uma banana. E o seu último concerto foi no Ché (de Che Guevara) Stadium em Nova Iorque, onde chegaram um dia antes, para poder sair antes do público aparecer… Estes são os Rutles, uma genial paródia de 1978 aos Beatles na linha nonsense à la Monty Python (ou não nascesse de uma ideia de Eric Idle), com canções criadas por Neil Innes, co-autor da ideia. Apesar da genialidade dos textos e situações encenadas, dos paralelismos e anedotas, as canções são o melhor do filme (finalmente editado em DVD entre nós), roubando harmonias, frases ou sonoridades aos Beatles, transformando-as depois em algo imediatamente reconhecível, mas… completamente diferente.

O filme é hilariante, com valor acrescentado para os conhecedores da história dos fab four. Não falta o escândalo de John (perdão, Ron), quando diz que os Rutles eram “bigger than god”, equívoco criado pela imprensa, já que o músico queria dizer que eram “bigger than Rod”, referindo-se, claro, a Rod Stewart. Nem se poupam olhares irónicos à má gestão da Rutle Corp, numa cena de entrevista à porta do edifício, do qual sai gente com material roubado de cinco em cinco segundos. O entrevistador, nesta cena, é George Harrisson (que produziu depois A Vida de Brian), um dos muitos nomes da música e cinema que aderiram ao projecto, entre os quais se contam ainda Mick Jagger, Paul Simon, Ron Wood, Bianca Jagger, Dan Aykroyd e Michael Palin.
O sucesso do filme fez dos Rutles uma banda a sério, com álbuns gravados e concertos, sob direcção de Neil Innes (cuja velha banda, The Bonzos, surgiu no clássico Magical Mystery Tour, dos Beatles).

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Singles: Visage, 1979

Em finais dos anos 70 uma geração de londrinos noctívagos vivia, embora satisfeita com a revolução de hábitos provocada pelo punk, uma certa insatisfação. Crescidos a ver e idolatrar as estrelas do glam rock, particularmente Bowie, Bolan e Ferry, sentiam uma certa falta de aprumo na imagem e luz e cor na música. A evolução natural dos acontecimentos musicais, com manifestação de vitalidade pop logo nas primeiras formas de derivação em clima pós-punk (a que se convencionou chamar new wave), recuperava não só um melodismo carnudo herdado das grandes canções pop que o progressivo e o hard rock haviam abolido, como, mostrava interesse pelo disco sound e enorme curiosidade pelas emergentes ferramentas electrónicas. Um DJ e um entusiasta da noite juntaram-se, uma vez por semana no Blitz, um clube em Covent Garden, chamando outros desencantados às suas Bowie Nights, nas quais, além de Bowie se escutavam discos dos Kraftwerk, Roxy Music, Japan, Human League, Grace Jones, Iggy Pop, Sparks, Ultravox ou Brian Eno. O DJ (Rusty Egan) e o porteiro (Steve Strange), este famoso pela política draconiana que só permitia a entrada a quem comparecesse devidamente vestido em jeito de imaginação, pompa e exagero, fomentaram ali a génese de um movimento que acabou conhecido como “neo-romântico”. Um movimento que começou por ser manifestação de hedonismo com indumentária sofisticada e banda sonora requintada, mas que acabou por criar as suas bandas, dos Spandau Ballet aos Duran Duran, dos Classix Nouveaux aos Depeche Mode… Mas o primeiro dos grupos, e o primeiro disco da nova vaga nascia ali mesmo, entre os promotores das Bowie Nights. Steve Strange e Rusty Egan juntaram em torno de si músicos dos Magazine (Barry Adamson, John McGeosh e Dave Formula), o teclista dos Ultravox (Billy Currie) e o guitarrista Midge Ure (ex-Rich Kids que, pouco depois, seria convidado para novo vocalista dos Ultravox). Juntos, numa existência que nunca ultrapassou as fronteiras do estúdio, nunca actuando ao vivo, e com exposição pública centrada na figura vistosa de Steve Strange, formaram os Visage, a banda-paradigma do movimento neo-romântico, que editou três álbuns de originais entre 1980 e 84, e com pico de glória no ainda hoje recordado Fade To Grey. O primeiro passo deram-no, antes de descobertos por uma multinacional, pela pequena independente Genetic Records, ao bom jeito de qualquer boa manifestação nascida de herança punk. Aí editaram, em 1979, o single de estreia Tar, primeiro foco de uma ideia que depois ganharia adeptos, que esgotou num ápice a pequena edição de lançamento. A canção cruzava evidente genética Bowie com novas visões pré-80, e a capa vincava mais ainda a vénia ao mestre-camaleão, com Steve Strange com um olho de cada cor. O single foi recentemente “citado” num lado B dos White Rose Movement.

VISAGE “Tar” (Genetic Records, 1979)
Lado A: Tar (Visage)
Lado B: Frequency 7 (Visage)
Produção: Visage
Não se classificou na tabela britânica


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Every Move A Picture: álbum em Junho

Os Every Move A Picture, de San Francisco, anunciam oficialmente a edição do seu álbum de estreia, Heart = Weapon, para o dia 5 de Junho, pela V2. Antes, a 22 de Maio, será editado o single Signs Of Life, originamente lançado em edição exclusiva em vinil em 2005, ano em que uma versão EP, com cinco temas (quatro deles agora recuperados para o álbum), chegou também à loja iTunes. O alinhamento de Heart = Weapon inclui os temas Mission Bell, Signs Of Life, The Best Is On The Outside, Chemical Burns, Outlaw, Dust, Simple Lessons On Love And Secession, On The Edge Of Something Beautiful, Dixie e St Johns Night. Por aqui já se aguarda, com ansiedade, as críticas da praxe, no registo em voga, ou seja, o clássico “soa a…”… Siga!

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sexta-feira, abril 14, 2006

Mais um álbum dos Beatles? Sim...

Por esta altura, praticamente todos os temas oficialmente gravados em estúdio pelos Beatles estão editados em vinil ou CD, nos discos originais ou em antologias, em singles, álbuns ou caixas... Mas, ano após ano, dos baús que guardavam o que parecia destinado ao esquecimento saltam surpresas, novidades, por vezes temas inéditos. É o que vai acontecer, a propósito da montagem de um espectáculo musical criado em torno da música dos Beatles, a estrear brevemente em Las Vegas. O espectáculo, que terá por protagonista a companhia Cirque du Soleil, vai usar na sua banda sonora algumas canções inéditas dos Beatles, recuperadas e retrabalhadas expressamente para este efeito. O antigo produtor dos Beatles, George Martin, está a trabalhar na música de fundo para o espectáculo, que utilizará gravações desconhecidas da banda, restauradas e remasterizadas. Estas gravações serão depois reunidas e editadas num álbum, com data de edição ainda por definir.

A agenda de 2006 de François Ozon

François Ozon, de quem o mais recente filme Le Temps Qui Reste terá dentro de dias ante-estreia no Indie Lisboa, tem já a agenda preenchida para os próximos tempos. Neste momento faz a pós-produção de Un Lever de Rideau, média metragem rodada no Outono de 2005, com Louis Garrel, Mathieu Amalric e Vahian Giocante, naquele que é o retomar de um formato no qual assinou filmes menos divulgados, mas soberbos, como La Petite Mort ou Une Robe d’Eté. Depois parte rumo à sua primeira longa metragem em inglês. Paradize, com Charlotte Rampling, Sam Neil e Romola Garai, que contará a história de uma jovem escritora proveniente de uma ascendência desfavorecida e de um outro artista, aristocrata. Sobre Le Temps Qui Reste, um dos melhores filmes de Ozon, fica prometido para breve um post.

Porky's Chainsaw Massacre

Muito se tem falado de Hostel, de Eli Roth, filme que esta semana chegou aos nossos ecrãs. Trata-se de uma tentativa de reinvenção de modelos do cinema de terror, mas que enferma de um sadismo doentio, que já lhe valeu em alguns textos o rútulo de porn gore… O filme mostra-nos cenas de umas férias de turismo sexual de dois jovens americanos e de um islandês que conhecem algures em Amsterdão. Juntos partem rumo aos arredores de Bratislava, em busca de um hotel onde, segundo lhe prometera um estranho de leste que conheceram em final de noite em Amsterdão, as mulheres são lindas e, por dinheiro, se faz tudo o que se quiser… Tudo… Ele não mentiu, já que o hotel das beldades fáceis não é mais que um pólo de recruta involuntária de pessoas que, raptadas, acabam servidas a clientes que pagam para matar. Com todos os requintes de malvadez, berbequim sobre carne, alicates sobre dedos, maçarico para queimar olhos, e o que mais as psicoses de cada um entenderem aplicar às suas vítimas… A ideia até parecia potencialmente interessante, e podia levantar reflexões sobre os limites do sadismo no bicho homem. Mas acaba por transformar o filme numa carnificina de reality show, gratuita e ensanguentada, horrores atrás de horrores, doseando gore gratuito onde alguma inteligência crítica e interventiva poderia ter feito a diferença. A primeira hora é triste e pueril caça ao corpinho perfeito. E a sequência final, um mergulho num matadouro que nem o pior pesadelo poderia imaginar, para destruir o corpinho que se paga, mas onde a realização escorrega no terror fácil pela exposição das mutilações, em vez de apostar numa investigação profunda sobre os motivos que podem levar psicopatas, engravatados, a pagar para matar o semelhante… No fundo, uma ideia com potencial para investigar demónios profundos do sadismo e da perturbação psicopata, acaba transformado num híbrido de Porky’s com Massacre no Texas. Pueril e profundamente desinteressante. Isto para não falar na ostensiva localização da história num espaço real, o que valeu, justificadamente, críticas severas do embaixador da Eslováquia nos EUA. Pueril, também aqui, assim como irresponsável, a atitude do realizador.

EM REPEAT: The Knife

Por aqui ouve-se, em Repeat, o genial Marble House dos suecos The Knife. Trata-se de uma magistral peça de pop elegante, espartana em recursos e exclusivamente electrónica nas ferramentas, mas que recorre inteligentemente a um subtexto melódico captado na tradição folk escandinava. Um perfeito cartão de visita para o magnífico álbum The Silent Shout, que na próxima semana terá edição entre nós.

quinta-feira, abril 13, 2006

Philip Glass editou duas novas sinfonias

Philip Glass, desde que criou a Orange Mountain Music, tem mantido uma actividade editorial quase tão intensa quanto a sua produção musical. A editora acabou de lançar duas novas sinfonias suas, a sexta e a oitava.
A sexta é, tal como a quinta e a sétima, uma obra vocal, trabalho nascido de uma parceria com Allen Ginsberg que a morte deste em tempos interrompera, mas que Glass recentemente retomou e concluiu. A sinfonia, com subtítulo The Plutonian Ode, não foge à linha de trabalhos recentes de Philip Glass, apresentando o texto de Ginsberg cantado por um soprano. O álbum, duplo, apresenta no segundo disco uma versão alternativa desta sinfonia, com a voz de Ginsberg a ler o seu texto sobre a orquestra e canto.
Infinitamente mais interessante, e capaz de se colocar já ao lado da genial 5ª sinfonia, entre as melhores obras de Philip Glass, a sua nova oitava sinfonia é uma surpresa, e está a arrebatar entusiasmos mesmo junto dos mais cépticos da sua música. É uma peça longa, exclusivamente instrumental, pensada na linha das sinfonias concertantes características do período clássico, permitindo visibilidade protagonista a diversos instrumentos. É uma sinfonia de rumo sempre inesperado, com mudanças cromáticas, desafios na melodia e surpresa a cada novo momento, contrariando algumas das características mais recorrentes da obra recente de Glass. Estão lá as marcas do minimalismo que lhe é estrutural, mas há respiração diferente e uma sensação de mudança de ares que lhe dá, como no soberbo Orion editado no ano passado, sinais de que há novos caminhos ainda a trilhar por estas bandas. Os discos deverão ter, brevemente, distribuição entre nós pelo seu importador habitual, mas para já estão disponíveis no iTunes.

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Depois do som e da cor... o cheiro!

Como se não bastasse o cheiro das pipocas (nas salas em que se permita que haja quem as masque, claro), uma nova novidade olfactiva vai chegar aos cinemas… No Japão, algumas salas vão exibir o filme The New World, de Terence Mallick, com… cheiro! Na base das cadeiras da fila de trás haverá máquinas que vão lançar para a sala sete fragâncias ao longo da exibição do filme, nomeadamente um aroma floral nas cenas de amor, e por aí adiante… A ideia não é novidade no Japão, mas até aqui apenas para consumo caseiro, uma vez que em 2005 foi comercializada uma máquina de cheiros (a 750 euros) para usar para aromoterapia (pois é, inventam tudo), durante as horas de trabalho ou de leitura do horóscopo.
Pois agora temos cheiro no cinema… O som foi boa ideia… A cor também, mas… cheiro? E logo num filme como o novo de Mallick! The New World não chega aos calcanhares de Thin Red Line, mas não é mau de todo… E com esta coisa do cheiro até começo a pensar que o rótulo “new age”, que uma voz amiga e esclarecia lhe aplicou, se calhar faz sentido…

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Este fim-de-semana na Radar

Fala com Ela. Esta semana, a fazer contagem decrescente para a terceira edição do IndieLisboa, Rui Pereira, um dos directores do festival, fala de si, de cinema, e dos seus discos.
Sábado 12.00 / Domingo 17.00

Álbum de Família. Num momento em que sai uma antologia dos seus primeiros 15 anos de vida, recorda-se Blue Lines, o álbum de estreia dos Massive Attack, em 1991.
Domingo, 12.00

Discos Voadores. Mais uma edição de discos perdidos, esta semana a revisitar, de 1990, Cardiffians, o segundo álbum da parceria Devine & Statton, a ex-Young Marble Giants Alison Statton e o ex-Ludus Ian Devine.
Sábado 18.00 / Domingo 22.00

Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm

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Filme sobre Coachella em DVD

O filme de Drew Thomas sobre o festival Coachella vai ter edição em DVD no mercado norte-americano nos próximos dias. Trata-se de um documentário de balanço sobre os seis primeiros anos de vida de um festival que, neste momento, é um dos mais desejados e visitados por públicos com gostos alternativos. O DVD inclui, entre outras, imagens de actuações dos Arcade Fire, Belle & Sebastian, Radiohead, Fischerspooner, Björk, Morrissey, Bright Eyes, Pixies, Flaming Lips e White Stripes, e uma aparição discreta de Beck. A edição de 2006 do Coachella tem lugar no Empire Polo Field, entre os dias 29 e 30 deste mês, num cartaz de fazer inveja no qual constam, por exemplo, Depeche Mode, Madonna (em estreia festivaleira), Daft Punk, Franz Ferdinand, Clap Your Hands Say Yeah ou Sigur Rós.

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Sufjan lança "sobras" de 2005 em disco

Sufjan Stevens lança, no próximo dia 25 um novo disco. Contudo, ao contrário das expectativas de muitos, não se trata ainda de um terceiro álbum dedicado a um estado americano, nem mesmo um registo de canções avulsas, reunidas apenas porque as decidiu assim gravar. Nada disso. The Avalanche não é mais que a reunião, em disco, de uma série de temas originalmente gravados nas sessões que geraram o genial Illionis, do ano passado, ou seja, uma compilação de “sobras”, que acabaram fora do alinhamento de um álbum onde, na verdade, nada mais cabia (nem lá fazia falta). O alinhamento deste disco complementar a Illinois é extenso, essencialmente constituído por inéditos, mas incluindo ainda versões alternativas de temas dedicados ao estado ao qual dedicou o álbum do ano passado. Entre as versões, há três leituras alternativas de Chicago (uma acústica, outra em jeito easy listening, uma ainda mais, anunciada como multiple personality disorder)…

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segunda-feira, abril 10, 2006

Discos da semana, 10 de Abril

The Streets “The Hardest Way To Make An Easy Living”
Um olhar minucioso e crítico (como sempre reconhecemos na música de Mike Skinner) sobre a vida que a fama pop altera. A existência sobre olhares permanentes, o amor entre famosos, as drogas, o caos, até mesmo tendências suicidas. Mas em vez de um confessionalismo mais directo e apenas realista, Skinner reencontra um sentido de humor. E, a rir, como manda a velha máxima, castiga os hábitos. When You Wasn’t Famous, caricatura as “dificuldades” pelas quais passa o “famoso” na era dos telemóveis com câmara: “how the hell am I supposed to be able to do a line in front of complete strangers / When I know they’ve all got cameras?”… Em Never Went To Church reflecte o que aconteceu a tantos outros agnósticos que sentem a necessidade de um inesperado conforto na fé em momentos mais difíceis. E não falta em Two Nations o olhar irónico do inglês sobre o americano. Musicalmente o álbum representa também uma manifestação ressaca face à eloquência do genial disco de 2004. Apesar de alguns momentos de minuciosa concepção de cenários (como no já referido single ou no tema-título, onde “pilha” os Moody Blues), o disco assinala essencialmente um regresso à casa partida, num retomar de princípios estruturais e decorativos mais próximos das suas raízes originais UK garage e hip hop. Não perde, contudo, a canção de vista, sublinhando e reforçando o estatuto de grande escritor de canções que nele muitos apontam desde o seu primeiro álbum. E tudo isto no mais vulgar sotaque cockney, pontapés na gramática também suficientes para estremecer as fundações do bom inglês…

She Wants Revenge “She Wants Revenge”
Reencontrar sonoridades e entusiasmos que escutavam nos discos que ouviam há 25 anos é verdade transversal à belíssima estreia dos She Wants Revenge, duo caloforniano que promove um espaço de expressão de um gosto “clássico” pela canção, pelas referências pós-punk, em clara atitude de saudável alternativa aos estafados destinos do actual mainstream norte-americano. Depois de uns Interpol, Editors ou The Killers devia estar ultrapassada a preguiçosa tendência para dizer “soa a isto” (para “isto” igual a Joy Division)… Como se alguma coisa que estreie não soe, necessariamente, a alguma referência evidente (até a primeira sinfonia de Beethoven soava a Mozart!). Os She Wants Revenge podem fazer uma música que traduza heranças da Joy Division, dos The Cure (primeira fase), dos Depeche Mode (etapa mais negra). Mas não se limitam a um básico cut and paste revisionista, importando essas referências para construir um corpo actual de canções que mostra como essa célula primordial da cultura pop pode respirar vida. Não inventa, nem quer inventar. Mas comunica, interage, convida e desafia.. É preciso ser génio em ruptura para justificar que lhes escutemos os discos? Não me parece… Assim como não precisamos de revoluções todos os dias…

X-Wife “Side Effects”
O trio segue o mesmo caminho trilhado no álbum de estreia, projectando um presente que se continua a fazer da assimilação de inspiradores códigos herdados de finais de 70, punk e pós-punk. A convivência das guitarras com voz e electrónicas é mais fluente que no primeiro álbum, contudo a urgência em extravasar ideias impede que algumas amadureçam um pouco mais. E o disco, que abre com o excelente Ping Pong, raras vezes volta a mostrar a mesma capacidade em suportar a construção de uma tão boa canção do princípio ao fim. Há belíssimos momentos quando electrónicas e guitarras levantam a voz e quase discutem quem manda mais... Estão no bom caminho…

Stereolab “Fab Four Suture”
Os Stereolab têm, com alguma frequência, reunido em álbum as canções que editam nos seus muitos (e sempre recomendáveis) singles. Fab Four Suture recolhe EPs editados nos últimos meses, num projecto desde a partida definido como um álbum em construção, por peças, single após single. Daí, talvez, um sentido de coesão que domina o disco, no qual o grupo volta a dar-nos uma magnífica colecção de peças pop, de canções irresistíveis como Vodiak ou Interlock a instrumentais minimalistas, obsessivos e viciantes como o díptico Kybernetica Babicka. Electrónicas analógicas, visão melodista e uma voz de sonho ao serviço de uma pop sempre viva e sedutora.

Teddy Thompson "Separate Ways"
Apesar de um magnífico tema de abertura, no qual colaboram os manos Rufus e Martha Wainwright, o filho de Robert Thompson mostra neste seu segundo álbum que quer manter a sua identidade folksy mais convencional acima de outros devaneios sónicos. Se a grande escrita ali nascesse, nada em contrário. Mas nem as canções são de excepção, nem os caminhos que trilham mostram ainda particular personalidade.

Também esta semana: I Am X, Calexico, Elefant, Camané (DVD), Buzzcocks, Lamchop, Aphex Twin, Beatles (reedições), Arctic Monkeys (DVD), The Mission (best of), Legendary Tiger Man

Brevemente
17 Abril: White Rose Movement, Protocol, Dizee Rascal, Bananarama (best of), The Knife, Faris Nourallah (reedição), Secret Machines, Ronnie Spector, Zutons, Charlatans, Miss Kittin, Madonna (remisturas, apenas em vinil), Philip Glass (duas sinfonias)
24 Abril: António Variações (integral de estúdio), Fiery Furnaces, Gnarls Barkley, Futureheads, Red Hot Chilli Peppers, Air (colaborações), British Sea Power, Thievery Corporation, Moloko (best of), The Dears, Tortoise, The Rakes, Gun Shys, Cure, k.d. Lang
1 de Maio: Basement Jaxx, Pearl Jam, Gomez, Scritti Politti, Teats For Fears (reedição), PJ Harvey (DVD

Maio: Pet Shop Boys, , Bruce Springsteen, Clear Static, Only After Dark (compilação pós-punk), Radio 4, Boy Kill Boy, Hot Chip, Outkast, Basement Jaxx, Gomez,), Grandaddy, Lisa Germano, Matmos, Roddy Frame, Fatboy Slim (best of), Frank Black, Muse, Zero 7, Sex Pistols (reedição), William Orbit, Spiritualized, Death From Above 1979, Velvet Underground (antologia), Elvis Costello + Allen Toussaint

Discos novos ainda este ano: Primal Scream (Junho), B-52’s, Björk, Beyoncé, Blur, Bryan Ferry, Cornershop (Maio/Juho), Damon Albarn (Verão), David Bowie (Junho), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Duran Duran (Verão), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Maio/Junho), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Junho), Michael Nyman (Maio/Junho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Outkast, Paul Simon, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters, Sisters Of Mercy, Madonna (Lisboa ao vivo DVD), New York Dolls (DVD)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Björk, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição).

Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.

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domingo, abril 09, 2006

Discos Voadores, 8 de Abril

Esta semana, a assinalar a edição de um CD e um DVD retrospectivos das duas etapas editoriais na vida dos Japan, um olhar pelos primeiros passos da carreira de David Sylvian.

Kelley Polar “In Time”
Spartak “King Tubby”
White Rose Movement “Girls In The Back”
The Upper Room “Combination”
She Wants Revenge “These Things”
X-Wife “Ping Pong”
Japan “Fall In Love With Me”
Yeah Yeah Yeahs “Cheated Hearts”
Architecture In Helsinki “Frenchy, I’m Faking”
The Organ “A Sudden Death”
Morrissey “I Will See You In Far Off Places”
The Kills “I Call It Art”
One Dove “Fallen (remix)”
The Streets “When You Wasn’t Famous”
Spin Hour “First Take”

Mão Morta “O Pai”
Strokes “Ask Me Anything”
Cindy Kat “Substância D”
Japan “Quiet Life”
Japan “Transmission”
Japan “Hallowen”
Japan “Taking Islands In Africa (remix)”
Japan “Talking Drum”
Wallin + Tisa “Visions Of China”
Japan “Nightporter”
David Sylvian “Some Kind Of Fool”
Faris Nourallah “Christian Flyer”
Dead Combo “A Menina Dança?”

Sábado 18.00-20.00 / Domingo 22.00-24.00
Radar 97.8 FM
e radarlisboa.fm

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sexta-feira, abril 07, 2006

Gorillaz: um fim anunciado em FM

Damon Albarn, em entrevista à BBC 6, disse ontem que se vai afastar dos Gorillaz, decisão que deverá implicar o fim de carreira para a banda virtual criada por si e pelo desenhador James Hewlett. Albarn entendeu que tinham levado o conceito por detrás dos Gorillaz até onde podiam, declaração que chega numa altura em que o grupo tem editados dois álbuns de originais de sucesso, outros tantos de extras e remisturas, e ainda mais dois DVDs (o segundo, ao vivo, editado há poucos dias), e está a terminar uma série de concertos em Nova Iorque. A notícia não espanta, sobretudo numa altura em que os Blur retomaram a actividade e se preparam para completar o trabalho de gravação de um sucessor de Think Tank que já anunciaram mais simples e directo que as recentes gravações da banda. Contudo, na mesma entrevista, Damon Albarn avisava: “mas também é muito hip hop dizer-se que um projecto acaba e, depois, voltamos a trazê-lo à vida”… Onde ficamos então?...
Se as finanças o ajudarem, e a vida dos Blur se mantiver saudável, o dito será o dito. Assim se espera, fechando-se um ciclo criativo em alta, sem o mais pequeno arranhão de decadência. E aos Gorillaz caberá um daqueles raros papéis de vida pop consequente a cem por cento.

Contudo, convém que se lhes não atribua um rótulo que, vezes sem conta aplicado, não lhes é devido. Os Gorillaz não são a primeira banda virtual da história. Em 1968, e para dar vida a um desenho animado, foram criados os Archies, cujo sucesso global de Sugar Sugar e, logo depois, Jingle Jangle, obrigou a ter vida mais longa que o originalmente previsto. Contudo, e ao contrário dos Gorillaz, os Archies nunca usaram as suas identidades em promoção na imprensa, nem a sua fisionomia na imagem dos cartoons. O grupo foi criado pelo produtor Don Kirshner, que já tinha trabalhado com os Monkees, para gravar uma canção, semanalmente, para os desenhos animados do canal da CBS, The Archie Show. O sucesso dos discos deu-lhes pontualmente amplitude maior, sobretudo na rádio. Mas dois anos depois tudo não passava de memória. E os músicos (de estúdio) que tinham gravado os discos dos Archies estavam entregues a outras sessões.

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Sisters Of Mercy: o grande engano

Como muitos velhos admiradores dos Sisters Of Mercy não deixei de ir ao Coliseu ver como soavam, 25 anos depois… Foi uma das maiores desilusões que vi em palco nos últimos tempos. A crítica foi hoje publicada no DN. Aqui fica uma versão “curta”:

A primeira ressurreição dos Bauhaus, em 1998, e a segunda, que os trouxe novamente até nós há algumas semanas, devolveram aos palcos a música intensa e a teatralidade sombria do verdadeiro rock gótico de primeira geração. Conscientes do carácter datado da sua música (e do seu peso histórico), os Bauhaus encenaram uma sólida ilusão de viagem no tempo. E vê-los, hoje, é como visitar uma galeria de peças que contam história. O mesmo não se pode dizer dos Sisters Of Mercy, que, apesar de terem representado outro dos pilares do movimento gótico, nunca gostaram do rótulo e parecem fazer o possível e o impossível para apagar essa marca do seu passado. Porém, foi pela memória de uma música (gótica) que o Coliseu encheu para os rever. E o ensopado de equívocos que serviram nem soou a novo, nem saciou memórias. As nostalgias só fazem sentido se quem as quer vender as souber aceitar e projectar com respeito por quem as paga para ver e escutar.
Os Sisters Of Mercy de 2006 só têm em comum com a banda com o mesmo nome que gravou discos marcantes entre 1983 e 87 um vocalista e um corpo de canções. Mas, mesmo ainda cava, a voz de Eldrich já não tem a força negra de outros tempos. E as canções estavam irreconhecíveis, despidas da eloquente cenografia ambiental que as caracterizava, em seu lugar habitando agora um puré de electricidade desmedida, programações ininterruptas, e... o horror... solos de guitarra! O guitarrista que hoje toca na banda não esconde que preferia estar num grupo de hard rock. Inenarrável
.
Publicado no DN a 7 de Abril de 2006

Singles: Kraftwerk, 1975

Habituámo-nos a ver o clássico tema Autobahn (do álbum de 1974 do mesmo título) como a primeira materialização de uma ideia pop com ferramentas electrónicas. De facto, nesse tema de duração mais próxima dos contemporâneos devaneios progressivos que da lógica do single pop, procurava explorar uma ideia de melodismo pop, uma estrutura alternada entre uma sugestão de quase-refrão e desenvolvimentos, representando tematicamente uma visão germânica de uma identidade “pop”, com espelho de personalidade colectiva encontrado numa auto-estrada, da mesma forma como os Beach Boys tinham retratado a Califórnia de inícios de 60 através do surf. Mas Autobahn não era a única tentativa de construção pop nesse álbum dos Kraftwerk. De resto, mais próximo até da estrutura da canção, e com duração de pouco mais de cinco minutos, o menos popular Kometenmelodie 2 é, na verdade, a primeira materialização de facto de uma ideia de “canção” (ainda instrumental) na obra dos Kraftwerk. Autobahn, na época, conheceu uma versão editada a poucos minutos para comercialização a 45 rotações, conseguindo assim chegar às rádios, promovendo o álbum e uma extensa digressão mundial que o grupo alemão então levou para a estrada, já em 1975. Kommenenmelodie 2 foi então editado como segundo single extraído de Autobahn, não conseguindo contudo repetir os feitos do tema-título do álbum. É, contudo, um interessante pedaço de electrónica visionária, ainda ingénua na melodia, mas firme num desejo de levar a pop a um terreno nunca antes visitado pelo homem. O tempo deu-lhes razão. No lado B do single servia-se um edit de um tema do álbum Kraftwerk.

KRAFTWERK “Kometenmelodie 2” (Vertigo, 1975)
Lado A: Kometenmelodie 2 (Hütter/Schneider)
Lado B: Vom Himmel Hoch (Hütter/Schneider)
Produção: Ralf Hütter e Florian Schneider
Não classificado na tabela inglesa de singles

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quinta-feira, abril 06, 2006

Divine Comedy com novo álbum em Junho

Os Divine Comedy anunciam para meados de Junho a edição do sucessor de Absent Friends. Chamar-se-á Victory For The Comic Muse, título que evoca Fanfarre For The Comic Muse, o primeiro álbum de Neil Hannon, habitualmente ignorado (porque muito mauzinho) nas discografias dos Divine Comedy). O álbum será precedido, uma semana antes, por um single, ainda não escolhido. Neil Hannon compôs, assinou arranjos e produziu o álbum, no qual conta com alguns velhos colaboradores. Em Maio, o grupo regressa à estrada para promover o disco numa digressão que, para já, tem datas marcadas para Inglaterra e Irlanda.

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Bernardo Sassetti estreia 'Alice' ao vivo

A música de Alice nasceu primeiro para ilustrar imagens de um filme de Marco Martins. Em Dezembro do ano passado, numa operação de estúdio e fabrico de CD quase fulminante, chegou aos discos (e acabou por ser o melhor álbum português editado em 2005). Hoje, a terceira etapa da vida desta música dá o primeiro passo, num concerto de Bernardo Sassetti no agora reaberto Teatro Maria Matos, em Lisboa, pelas 21.30. O concerto vai trazer uma nova dimensão visual à música de Alice, num projecto de interacção com o vídeo, num trabalho realizado por Guta de Carvalho, sobretudo conhecido pelo seu trabalho em fotografia. As imagens mostrarão os lugares e gentes de Lisboa sob sugestões de indiferença e náusea. Os sons da cidade, que se escutavam no filme, e o músico fez questão de levar para o disco, também estarão representados na versão de concerto de Alice e a música surgirá com novos arranjos, ampliações e outros desenvolvimentos. Segundo me confirmou o próprio Bernardo, o respeito pelo filme estará sempre presente no concerto, sendo certo que, por vezes, haverá momentos em que a improvisação há de vir ao de cima. Imperdível.

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Este fim de semana na Radar

Fala Com Ela. Nuno Artur Silva é o convidado da semana, para falar das Produções Fictícias e dos seus discos.
Sábado 12.00 / Domingo 17.00

Álbum de Família. Esta semana recorda-se o clássico pós-punk Pink Flag, dos Wire, motor para muitos entusiasmos que se voltaram a escutar nos últimos dois anos.
Domingo 12.00

Discos Voadores. Redescobrem-se os primeiros passos de David Sylvian, ou seja, o seu início de carreira como vocalista e compositor dos Japan, entre 1978 e 1983.
Sábado 18.00 / Domingo 22.00

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terça-feira, abril 04, 2006

'Blitz': Histórias na primeira pessoa

Ia a caminho do autódromo do Estoril, numa manhã de chuva, para ver a primeira sessão de treinos do regressado GP de Portugal de Fórmula 1 no final do Verão de 1984, cartaz de fabrico caseiro, em cartolina, a berrar “Keke Rosberg” nas mãos. E deram-me um flyer anunciando um novo jornal de música. Chamar-se-ia Blitz, com estreia apontada no mês de Novembro. Bela notícia, num país que ia lendo sobre música nos raros e importados (e caros) Melody Maker, NME ou The Face e, em português, no Se7e, Música & Som, na cada vez menos frequente Mundo da Canção, e aos sábados, no Som 80 (do Portugal Hoje), suplemento de resto na génese do Blitz.
O jornal chegou, Siouxsie na capa, e uma postura aberta às diversas frentes da música pop, com particular atenção para com a “música moderna portuguesa” (como então se chamava), acompanhando de perto desde então o nascimento, evolução (e às vezes morte) do que por cá se foi fazendo. Em pouco tempo o Blitz tornou-se indispensável e, juntamente com o Som da Frente de António Sérgio (na Rádio Comercial), o Rock Rendez Vous, mais tarde o jornal LP e mais alguns programas na rádio, contribuiu para o desenvolvimento de uma sólida cultura musical alternativa entre nós, da qual nasceram nomes de referência como uns Pop Dell’Arte, Mão Morta, Mler Ife Dada, entre muitos mais.
O Blitz passou a fazer parte ainda mais importante da minha vida a partir de 1992, quando, depois de uma conversa telefónica com o António Pires (então Chefe de Redacção) me apresentei na redacção na tarde seguinte, sala escura nas mais escuras ainda velhas instalações no Dafundo. Com o António, o Rui Monteiro (director), o Miguel Francisco Cadete, a Rita Duarte, a Cristina Duarte, a Cândida Teresa (directora gráfica), o Paulo Sardinha e a Quicas (designer), vivi as páginas daquele jornal sete dias por semana durante dois anos. Ali aprendi a ouvir discos de outra maneira, a equilibrar o novo com a memória. Escrevia em doses familiares (como sempre, eu sei), sobretudo nas áreas do hip hop e música de dança, com algumas incursões pela cena pop/rock alternativa, e um ou outro mergulho na memória pop. E sobre o Star Trek, dinossáurios (na fase Jurassic Park) e os demais sabores daquela semana. E quando não me deixavam escrever sobre o que queria, "metia" em página um pregão de contestação, à má fila, claro… Os pregões, de resto, passaram a ser revistos depois de um particularmente óbvio… Foram dois anos de formação pessoal fundamental, nos quais o jornal foi adquirido pelo grupo que actualmente o detém, e então substancialmente profissionalizado.
Saí do Blitz (para o DN) na semana da morte de Kurt Cobain. Mas o Rui Monteiro, que não nasceu ontem e já andava nisto há algum tempo, manteve a capa anteriormente marcada, e que assinalou o meu último trabalho para o jornal. Era uma entrevista com um promissor talento em tempo de estreia em disco e que prometia ser notícia esse ano e ali tinha a primeira capa, chamado… Pedro Abrunhosa.
Acompanhei sempre o jornal desde então. Nos melhores e nos piores dias. Das fases de equívocos (e por vezes quase desisti) às tentativas de inteligente reinvenção com o Pedro Gonçalves e, mais recentemente, o Miguel Francisco Cadete (cujo Blitz dava novamente prazer de ler).
Mas agora anuncia-se o fim. E uma revista como destino em Junho que, naturalmente, deverá procurar outros caminhos e abrangência, já que o aumento do número de vendas parece na mesa das prioridades. Mas é um projecto do Miguel, pelo que dele podemos esperar jornalismo musical (e talvez não só) sólido, sério e atento a vários públicos.
Mas o fim é triste, na sequência de um período difícil, descaracterizado e com inevitáveis quebras de vendas. Num país onde o jornalismo musical não existe (uns suplementos, mais página aqui e ali e uns blogues não fazem, por si, um meio), o Blitz era farol protagonista. A pedir outros rumos, alargamento de visão (e de públicos) há já muito tempo, é verdade. Mas, ainda, espaço determinante para a música ser notícia entre nós. Que venha a revista. Que seja o que o Blitz queria voltar a ser. Que empregue os seus jornalistas (apesar da ameaça dos despedimentos que sobre a maioria paira). Que faça da música notícia capaz de estimular mais que os telemóveis, as novelas com açúcar e afins, que isto de carpir males em velórios não vale a pena, se há nova vida anunciada.
Arriba avanti!

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segunda-feira, abril 03, 2006

Discos da semana, 3 de Abril

Morrissey “Ringleader Of The Tormentors”
Ao fim de mais de seis anos de vida em Los Angeles, para procurar solo fértil para projectar novas canções, Morrissey mudou-se para Roma. E a cidade agarrou-o como nem ele esperara. Ali encontrou o amor. E o novo álbum, naturalmente, não podia deixar de reflectir esse novo Morrissey, renascido em Itália. O ambiente que caracterizou a etapa de composição e as canções que foram nascendo, o desafio ao velho mestre Tony Visconti e a presença de Ennio Morricone como arranjador das secções de cordas, colocaram em cena uma plêiade de elementos aliciantes. Às suas fontes de inspiração literárias clássicas (Oscar Wilde, T.S. Eliott, Philip Larkin, W.H. Auden) juntamos a descoberta profunda da obra de Pasolini (na poesia, mas também no cinema), sob identificação política e, sobretudo, religiosa, noção de “culpa” católica obsessivamente presente. E, acima de tudo, há de novo, e pela primeira vez, a expressão física do sexo com um género específico. Um homem feliz fazia o seu disco. Um disco onde a crítica mordaz ao momento político mundial partilha espaço com uma generosidade e boa disposição que não imaginávamos possível no céptico que há dois anos gravou o genial, mas irado, por vezes defensivo, You Are The Quarry. A própria capa do álbum, onde imita um David Oistrakh em pose de entrega a Tchaikovsky, é provocadora (como sempre) mas irónica (como nunca). O único problema de Ringleader Of The Tormentors pode ser a comparação directa que somos tentados a fazer contra o superior álbum anterior, e a inevitabilidade de não apresentar um conjunto de canções do mesmo calibre. Mas, depois do embate e aparente desilusão, este é um disco que conquista aos poucos e depois satisfaz em pleno. Um disco onde o ícone maior da geração pop indie de 80 sai do intelecto para descobrir a carne.

Neil Diamond “12 Songs”
Nas mãos de Rick Rubin, o veterano Neil Diamond (que sempre recordamos de discos mais duvidosos que interessantes) grava em 12 Songs o melhor álbum de toda a sua longa carreira. Perante o par Neil Diamond/Rick Rubin, estabelecem-se imediatas comparações com a série de quatro álbuns através dos quais o mesmo produtor revitalizou a carreira de Johnny Cash, apresentando-o a uma nova geração de ouvintes, transformando-o no mito em que entretanto merecidamente se fez (o sucesso recente do filme Walk The Line que o diga). Mas Neil Diamond não é Johnny Cash. O velho mestre country, mesmo vivendo uma etapa menor desde os idos de 70, nunca fora estrela ligeirinha e somara até, nos anos 50 e 60, um lote fundamental de discos tão populares quanto musicalmente carnudos. Por seu lado, Neil Diamond sempre optou por fazer carreira sobre canções da sua autoria, característica que Rubin fez questão de vincar como essencial no disco. Depois de meses a ouvir velhos discos e a conversar, outros tantos a compor numa cabana nas Montanhas Rochosas, juntaram-se para gravar um disco sob o menor peso possível de instrumentação, mas que soasse, claramente, a Neil Diamond. E 12 Songs é, exactamente, o que Rick Rubin esperava do cantautor. Um disco de belíssimas canções, de voz segura e madura, e com arranjos que pontualmente juntam corpos adicionais a um tronco feito de canto e guitarra. Talvez imaginando o minimalismo de recursos, Neil Diamond não apresenta aqui sinfonias pop(ularuchas), mas antes canções simples onde o apelo da terra (não necessariamente projecções de heranças folk) se materializa.

The Organ “Grab That Gun”
São canadianas, de Vancouver, e um dos nomes de que mais se fala entre a actual geração de bandas nascidas sob clara admiração pelas heranças pós-punk. Este seu álbum de estreia data já de 2004 e não esconde as referências mais óbvias da sua música que encontramos, sobretudo nos The Smiths e Blondie, mas também no legado college rock de 80. A sua atitude denuncia aquela fronteira entre o amadorismo entusiasmado e os primeiros sinais de vida profissional. E as canções mostram (como se escuta em A Sudden Death) indícios de potencialidades que o futuro poderá transformar num caso sério. Uma boa estreia.

Flaming Lips “At War With The Mystics”
Depois de reinventados no superior The Soft Bulletin (1999), onde redescobriam sentidos para a canção pop rock através da subtil contemplação de heranças várias da América, sob um sentido plástico mais apurado que nunca. Depois de renovada a sua música uma extensão natural da mesma lógica a ferramentas electrónicas e a temperos psicadélicos mais evidentes em Yoshimi Battles The Pink Robots (2002), o novo álbum dos Flaming Lips era, naturalmente, um dos mais esperados do ano. Mas revela-se uma valente desilusão. Neste novo álbum parece que fazem questão de mostrar as potencialidades de uma carteira de loucuras ao serviço da música, insistindo na memória do psicadelismo, juntando doses valentes de intensões prog, mas sem um lote de canções que suportem as visões. E acabamos com um álbum de intenções estimulantes, mas deslaçado e inconsequente porque estruturalmente despido de grande escrita. É pena.

Erasure “Union Street”
Em meados de 80 os Erasure deram ao mundo uma mão cheia de belas canções pop trolaró. Mas desde o álbum Chorus que a ideia está esgotada, e de disco para disco arrastam o cadáver de uma ideia datada e criativamente exausta. Este novo disco é acústico… E não é pelas ferramentas que se salva uma carreira que já não mexe há muito tempo. Em tempos o grupo agradava uns e incomodava outros. Hoje, é inconsequente.

Mário Laginha “Canções & Fugas”
Mais uma manifestação de uma realidade que convém que se entenda e manifeste mais ainda em discos: o jazz é hoje um dos mais estimulantes pólos de invenção na música que se faz em Portugal. E depois de excelentes discos de Bernardo Sassetti em 2005, cabe a Mário Laginha mostrar novo episódio que justifica todas as atenções. A solo, parte de uma ideia de Bach, mas transporta-a para as suas linguagens e buscas. E nasce um álbum onde o piano nos fala de perto e arrebata. É já um dos discos obrigatórios do ano.

Japan “The Very Best Of Japan”
Pela primeira vez juntam-se numa mesma antologia canções das duas fases editoriais da vida dos Japan, que entre 1978 e 80 gravaram para a Hansa Records e depois, de 1980 a 83, para a Virgin. O olhar panorâmico por uma das mais criativas bandas pop do seu tempo, todavia com falhas na representação da fase anterior a 1979, na qual o grupo era ainda um estranho híbrido de New York Dolls, Bowie e Roxy Music com urgência pós-punk e desejos visionários, mas longe da eloquência da música que gravariam mais tarde, a partir do álbum Quiet Life.

Também esta semana: Daft Punk (best of), The Dears, Tim, Gary Numan, Neko Case, All About Eve (best of), Ciccone Youth (reedição), Grace Jones (best of), Dimitri From Paris, The Jam (antologia), Blue Aeroplanes, Marvin Gaye (DVD)

Brevemente:
10 Abril: The Streets, I Am X, Calexico, Elefant, X Wife, Camané (DVD), Buzzcocks, Teddy Thompson, Faris Nourallah (reedição), Secret Machines, The Knife, Ronnie Spector, Lamchop, Aphex Twin, Beatles (reedições), Arctic Monkeys (DVD), Calexico, Stereolab, The Mission (best of), She Wants Revenge, Legendary Tiger Man, William Orbit, Adam Green
17 Abril: White Rose Movement, Protocol, Dizee Rascal, Bananarama (best of), The Knife
24 Abril: António Variações (integral de estúdio), Fiery Furnaces, Gnarls Barkley, Futureheads, Red Hot Chilli Peppers, Air (colaborações)

Abril: British Sea Power, Thievery Corporation, Moloko (best of), Garbage (best of), The Dears, Tortoise, Clear Static, The Rakes, Gun Shys, Cure, Bruce Springsteen, Madonna (remisturas, apenas em vinil), Madonna (DVD), k.d. Lang
Maio: Pet Shop Boys, Clear Static, Only After Dark (compilação pós-punk), Radio 4, Boy Kill Boy, Garbage, Pearl Jam, Hot Chip, Outkast, Basement Jaxx, Gomez, Scritti Politti, Tears For Fears (reedição), PJ Harvey (DVD), Grandaddy, Lisa Germano, Matmos, Roddy Frame, Red Hot Chili Peppers, Fatboy Slim (best of), Frank Black, Muse, Zero 7, Sex Pistols (reedição), William Orbit, Spiritualized, Death From Above 1979, Velvet Underground (antologia), Elvis Costello + Allen Toussaint

Discos novos ainda este ano: Primal Scream (Junho), B-52’s, Björk, Beyoncé, Blur, Bryan Ferry, Cornershop (Maio/Juho), Damon Albarn (Verão), David Bowie (Junho), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Duran Duran (Verão), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Maio/Junho), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Junho), Michael Nyman (Maio/Junho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Outkast, Paul Simon, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters, Sisters Of Mercy, Madonna (Lisboa ao vivo DVD), New York Dolls (DVD)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Björk, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição)


Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.

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